Objecção ao Sedevacantismo: "O Papa Pio XII declarou que a excomunhão não impede o cardeal de ser eleito papa."

por Ir. Miguel Dimond e Ir. Pedro Dimond

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10ª Objecção: O Papa Pio XII declarou em Vacantis apostolicae sedis que um cardeal, qualquer que seja a excomunhão sobre a qual esteja submetido, pode ser eleito papa.

Papa Pio XII, Vacantis apostolicae sedis, 8 de Dezembro de 1945: “34. Nenhum dos cardeais pode, de forma alguma, nem sob pretexto de qualquer excomunhão, suspensão, ou interdito que seja, nem de qualquer outro impedimento eclesiástico, ser excluído na eleição activa e passiva do Pontífice Supremo. Nós assim suspendemos tais censuras somente para o propósito da dita eleição; em alturas que não estas, elas permanecem em vigor (AAS 38 [1946], pág. 76).”

Resposta: Como já demonstrámos antes, é um dogma que 1) os hereges não são membros da Igreja e, 2) que um papa é a cabeça da Igreja. É, portanto, um facto dogmático que um herege não pode ser a cabeça da Igreja, já que não é membro dela.

Então, o que quer autorizar o Papa Pio XII em Vacantis apostolicae sedis? Em primeiro lugar, há que entender que se pode incorrer em excomunhão por muitas causas. Historicamente, as excomunhões se distinguiam pelos termos maior e menor. Excomunhões maiores incorriam-se por heresia e cisma (pecados contra a fé) e alguns outros pecados mortais. Os que recebiam a excomunhão maior por heresia não eram membros da Igreja (como já o acabamos de demonstrar em detalhe). Contudo, a excomunhão menor não separava da Igreja, mas proibia a participação na vida sacramental da Igreja. O Papa Bento XIV fez clara a distinção.

Papa Bento XIV, Ex quo primum, #23, 1 de Março de 1756:

“Além disso, os hereges e cismáticos estão submetidos à censura da excomunhão maior pela lei do Can. de Ligu. 23, quest. 5, e do Can. Nulli, 5, dist. 19.” 1

A excomunhão menor, pelo contrário, se incorria por causas tais como violar um segredo do Santo Oficio, falsificar relíquias (c. 2326), violação de um claustro (c. 2342), etc. Todas estas são penas eclesiásticas ou da Igreja. Estas acções, mesmo que gravemente pecaminosas, não separam as pessoas da Igreja. E embora já não se utilizem os termos de excomunhão maior e menor, é ainda assim um facto de que uma pessoa pode incorrer numa excomunhão (por algo que não seja heresia) que não a separe da Igreja; por outro lado, se incorrer em excomunhão por heresia, então sim é separada da Igreja.

Portanto, um cardeal que é excomungado por heresia já não é mais um cardeal, porque os hereges estão fora da Igreja Católica (de fide, Papa Eugénio IV). Mas um cardeal que recebe uma excomunhão por outra coisa, ainda permanece um cardeal, se bem que num estado de grave pecado.

Então, quando o Papa Pio XII disse que todos os cardeais, qualquer que seja o impedimento eclesiástico ao qual estejam submetidos, podem votar e ser eleitos num conclave papal, isto pressupõe que são cardeais que tenham sido excomungados por razão outra que não heresia, uma vez que um cardeal excomungado por heresia já não é um cardeal de forma absoluta. O ponto chave que se deve entender é que a heresia não é meramente um impedimento eclesiástico ― portanto, não é disto que está falando Pio XII ― mas sim um impedimento pela lei divina.

O canonista Filippo Maroto explica: “Os hereges e os cismáticos estão privados do Pontificado Supremo pela própria lei divina, porque, mesmo que por lei divina não sejam considerados incapazes de participar em certos tipos de jurisdição eclesiástica, não obstante devem considerar-se excluídos de ocupar o trono da Sé Apostólica…” 2

Note que os hereges não estão excluídos do papado meramente por impedimentos eclesiásticos (lei humana eclesiástica), mas por impedimentos que provêm da lei divina. A legislação de Pio XII não se aplica à heresia, porque ele estava a falar dos impedimentos eclesiásticos: “… nem de qualquer outro impedimento eclesiástico…” Portanto, a sua legislação não indica que os hereges podem ser eleitos e continuar a ser papas, razão pela qual ele não mencionou os hereges. O Papa Pio XII se referia aos cardeais católicos que poderiam estar sob excomunhão.

A fim de corroborar ainda mais este ponto, suponhamos, a título meramente argumentativo, que a legislação do Papa Pio XII de facto significasse que um cardeal herético poderia ser eleito papa. Leia o que disse Pio XII:

“Nós assim suspendemos tais censuras somente para o propósito da dita eleição; em alturas que não estas, elas permanecem em vigor.”

Pio XII disse que a excomunhão é suspensa somente no momento da eleição; em outras ocasiões, devem permanecer em vigor. Isto significaria que a excomunhão por heresia entraria novamente em vigor imediatamente após a eleição e, então, o herege que fora eleito papa, perderia o seu cargo! Portanto, não importa qual o ponto de vista com que abordemos isto, um herege não pode ser eleito validamente e permanecer como papa.

Santo Antonino (1459): “No caso de o Papa ter se tornado um herege, ele encontrar-se-ia, por esse facto isolado e sem nenhuma outra sentença, separado da Igreja.  Uma cabeça separada de um corpo não pode, enquanto se mantenha separada, ser cabeça do mesmo corpo da qual foi cortada. Portanto, um papa que se separe da Igreja por heresia, por esse mesmo facto, deixaria de ser a cabeça da Igreja. Ele não poderia ser um herege e continuar como Papa, porque, uma vez que está fora da Igreja, não pode possuir as chaves da Igreja.” (Summa Theologica, citado em Actos do Vatican I. V. Frond pub.)

Se um herege (alguém que nega a fé) pudesse ser a cabeça da Igreja, então seria falso o dogma de que na Igreja há unidade na fé (isto é, una, santa, católica e apostólica). E assim está refutada a posição de que um herege poderia ser eleito papa validamente com base no que foi dito pelo Papa Pio XII.

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1  The Papal Encyclicals, vol. 1 (1740-1878), pág. 84.

2  Institutiones Iuris Canonici, 1921.

Do livro: A Verdade sobre o que Realmente Aconteceu à Igreja Católica depois do Vaticano II