- Nota: este artigo apresenta uma nova e importante citação de um papa sobre o tema do geocentrismo — uma citação que, até onde sabemos, não foi apresentada em nenhum outro artigo sobre este assunto. As páginas de introdução que precedem esta importante citação são cruciais para a compreensão do seu significado para o tópico. –
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NESTE ARTIGO:
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ORA, QUAL É A CONCLUSÃO APROPRIADA SOBRE O VERDADEIRO ESTATUTO TEOLÓGICO DO GEOCENTRISMO?
1) Em 1616, onze teólogos qualificadores do Santo Ofício condenaram o heliocentrismo como herético
2) O Doutor da Igreja, São Roberto Belarmino, concordou com a declaração do heliocentrismo como herético, e ele mesmo informou Galileu da decisão
3) A Congregação do Índice proibiu a publicação de obras heliocêntricas
4) Em 1633, depois de o Santo Ofício da Inquisição ter investigado Galileu como suspeito de heresia, obrigou-lhe a fazer uma abjuração que denunciou o heliocentrismo e considerou a negação do geocentrismo como herética
5) Em 1664-1665, o Papa Alexandre VII promulgou, por sua própria autoridade, um Índice proibindo todas as obras favorecendo o heliocentrismo e negando o geocentrismo; isto foi prefaciado pela sua bula papal, que declara que o Índice é parte da bula e tem sua autoridade papal
FACTOS INTRODUTÓRIOS E HISTÓRIA, INTRODUZINDO CINCO ACTOS / ARGUMENTOS RELATIVOS À NEGAÇÃO DO GEOCENTRISMO
É frequente acontecer de pessoas perguntarem o que pensamos sobre o geocentrismo, a visão de que a Terra é o centro fixo do universo em torno do qual o Sol gira. O geocentrismo é o ensinamento infalível da Igreja e da Sagrada Escritura? A visão de que o Sol está estacionado e que a Terra gira em torno dela (heliocentrismo) foi condenada infalivelmente aquando da condenação de Galileu Galilei no século XVII? Neste artigo, eu quero analisar este assunto muito discutido em conjunto com um outro: «baptismo de desejo». Quero examinar a questão da posição teológica do geocentrismo; e também quero mostrar que a questão da posição teológica do geocentrismo — independentemente do lado que uma pessoa assuma ao tentar responder — cria dificuldades insolúveis para aqueles que sustentam que o baptismo de desejo é o ensinamento vinculante da Igreja Católica. Após de examinar esses fatos, darei minha opinião sobre esta questão.
Os factos que serão apresentados neste artigo — incluindo uma nova citação de um papa sobre esta questão do geocentrismo que encontrei no meu estudo — demole a maioria dos argumentos que são próximos e queridos de coração dos defensores do baptismo de desejo. Esses factos demonstram, mais uma vez, que aqueles que aderem ao ensinamento ex cathedra sobre a necessidade do baptismo de água têm sido certos o tempo sobre o que constitui o ensinamento infalível e vinculativo da Igreja Católica.
Uma pequena mas significativa parcela de católicos tradicionais praticantes sustenta que a Igreja Católica ensinou infalivelmente o geocentrismo no século XVII, quando certos oficiais da Igreja condenaram Galileu Galilei por contradizê-lo com o modelo heliocêntrico. Com base no caso de Galileu, alguns argumentam que os crentes obstinados no heliocentrismo são hereges, ou pelo menos estão em pecado mortal por contrariar o ensinamento oficial da Igreja. Fomos contactados por vários indivíduos que aderiram a esta posição.
Num esforço de examinar os seus argumentos de forma objetiva, eu li vários artigos escritos por aqueles que fizeram do estudo desse assunto em particular (a posição teológica do heliocentrismo) uma parte significativa de seu trabalho. Para apresentar alguns dos principais factos do caso Galileu, quero citar algumas passagens do artigo de John Daly, The Theological Status of Heliocentrism (A Posição Teológica do Heliocentrismo). Ele ressalta que em:
«24 de Fevereiro de 1616: Os onze examinadores teológicos do Santo Ofício reúnem-se para considerar as qualificações teológicas a serem apropriadamente atribuídas às seguintes proposições:
(i)O sol é o centro do universo ("mundi") e absolutamente imobilizado em movimento local.
(ii)A Terra não é o centro do universo (“mundi”); não é imóvel, mas gira sobre si com um movimento diurno.
Todos por unanimidade censuraram a primeira proposição como “tola, absurda em filosofia [isto é, cientificamente insustentável] e formalmente herética em razão de contradizer expressamente as declarações da Sagrada Escritura em muitos lugares de acordo com o significado próprio das palavras, a exposição comum e a compreensão dos Santos Padres e dos doutos teólogos”; a segunda proposição que censuraram por unanimidade como “absurdo em filosofia” e teologicamente “pelo menos errónea em fé.”
25 de Fevereiro de 1616: Papa Paulo V é oficialmente informado desta qualificação teológica e confirma-a, ordenando ao Cardeal Belarmino convocar Galileu e (i) avisá-lo que deve abandonar as ditas opiniões; se ele se recusasse a obedecer, (ii) ordenar que se abstenha de ensinar, defender ou tratar desta doutrina e opinião de qualquer maneira; e, caso ele não concordasse com isso, (iii) a aprisioná-lo.
26 de Fevereiro de 1616: Cardeal Belarmino convoca Galileu à sua casa e diante de testemunhas transmite as ordens do Papa, ordenando-o em nome do Papa e de toda a Congregação do Santo Ofício a abandonar a posição em questão e a não mais mantê-la, ensiná-la ou defendê-la sob pena de ser julgado pelo Santo Ofício. Galileu promete obedecer.
3 de Março de 1616: Belarmino relata a submissão de Galileu ao Papa.
4 de Março de 1616: Pietro Guicciardini, Embaixador da Toscana na Santa Sé, informa ao Grão-Duque que o Papa Paulo V e Belarmino consideram a opinião de Galileu errónea e herética e pretendem realizar uma Congregação para assim a declarar.
5 de Março de 1616: A Congregação do Índice publica um decreto sobre a ordem do Papa Paulo V condenando absolutamente o estudo do Padre Foscarini acima referido e proibindo a circulação dos escritos de Copérnico e Zunica até que tenham sido corrigidos; também proíbe, em geral, todos os livros que ensinam a doutrina da imobilidade do sol. Não faz menção específica a Galileu ou aos seus escritos. O decreto explica que o motivo da condenação é que a doutrina da imobilidade do sol é “falsa e em absoluta contradição com a Sagrada Escritura,” mas não usa a palavra “herética.” Estes editos foram publicados pelo Mestre do Palácio Apostólico pelas ordens do Papa.»
Antes de prosseguirmos, vemos que, em 1616, onze examinadores de teologia do Santo Ofício condenaram o heliocentrismo como herético. Este não foi um pronunciamento ex cathedra, pois o Papa Paulo V não promulgou solenemente essa decisão por sua própria autoridade. Ele nem sequer a assinou, mas foi feita com seu conhecimento e aprovação. São Roberto Belarmino, um Doutor da Igreja, também estava ciente de e de acordo com a declaração dos onze membros do Santo Ofício. São Roberto Belarmino até mesmo informou Galileu da condenação do Santo Ofício.
A Congregação do Índice (a Congregação Romana encarregada de vigiar os livros perigosos) publicou um decreto sobre a ordem do Papa Paulo V, que proibia a circulação das obras heliocéntricas pela razão de serem contrárias à Sagrada Escritura. Após a condenação do heliocentrismo em 1616 e o decreto que proibiu as obras a favor, Galileu submeteu-se à decisão. Galileu também foi pessoalmente ordenado a não escrever nada sobre isso no futuro.
Cerca de uma década depois, no entanto, Galileu começou a trabalhar num artigo chamado: Diálogo de Galileu Galilei Sobre os Dois Grandes Sistemas do Universo, o Ptolemaico e o Copernicano. Este artigo não só tratava do heliocentrismo, mas era favorável a ele. A Inquisição descobriu isso e convocou Galileu a Roma para um julgamento. O julgamento começou na Primavera de 1633:
«12 e 30 de Abril e 10 de Maio de 1633: Galileu é examinado e afirma ter pretendido discutir o assunto hipoteticamente, colocando os argumentos para e contra cada sistema. Ele afirma ter esquecido que em 1616 ele tinha-lhe sido proibido escrever sobre o tema do heliocentrismo, alegando [correctamente] que isso não havia sido declarado no depoimento de Belarmino de 26 de Maio de 1616. Galileu admite que algumas partes do Diálogo parecem excessivamente favoráveis ao heliocentrismo, mas afirma que isso não foi mais que um acto de tola vaidade, pela qual ele entreteu-se a encontrar argumentos credíveis a favor de um sistema tão difícil de defender. Ele declara que ele mesmo não acreditou no heliocentrismo e não acreditava que este fosse verdadeiro desde 1616 quando ele foi informado de que foi condenado pela Igreja.» (John Daly, The Theological Status of Heliocentrism)
Em 22 de Junho de 1633, Galileu foi condenado pelo Santo Ofício da Inquisição (a Congregação Romana que lida com ofensas contra a fé) como veementemente suspeito de heresia por ter ensinado aparentemente em favor do heliocentrismo.
«22 de Junho de 1633: Galileu é condenado como veementemente suspeito de heresia e a quem é exigido abjurar o heliocentrismo e ser absolvido das censuras e penalidades nas quais considerou-se ter ele incorrido. Galileu fez a abjuração em questão e foi, portanto, absolvido. Ele foi condenado à prisão perpétua da Inquisição, uma sentença comutada no mesmo dia, de modo que ele de modo que lhe foi permitido residir como um indivíduo particular pelo resto da sua vida, embora limitado em seus movimentos e comunicações. O texto da condenação e abjuração de Galileu é extenso, mas a sua leitura cuidadosa é necessária para entender os problemas envolvidos em entender a mente da Santa Sé em 1633 sobre a posição teológica do heliocentrismo e solicita-se ao leitor neste ponto que refira-se ao texto completo incluído no Apêndice I.» (John Daly, The Theological Status of Heliocentrism)
Então, para resumir este ponto: em 1633, Galileu foi considerado suspeito de heresia por ter escrito algo favorável ao heliocentrismo depois de ter sido previamente condenado pelos onze teólogos do Santo Ofício. Obviamente, portanto, o Santo Ofício da Inquisição considerava a adesão ao heliocentrismo como herético com base em esta posição contradizer o decreto dos onze qualificadores teológicos do Santo Ofício em 1616, entre outras coisas. (Nota: Ainda não estou a examinar se essa decisão da Inquisição prova ou não que o heliocentrismo é herético; estou, antes de o fazer, simplesmente a expor os factos sobre o que ocorreu.)
Galileu fez a abjuração exigida pela Inquisição e foi absolvido. Segue-se o texto da condenação de Galileu pela Inquisição e a abjuração que ele fez. Neste texto abaixo, podemos ver que esta abjuração, composta pelos cardeais do Santo Ofício, identifica o heliocentrismo como herético, falso e contrário às Sagradas Escrituras. Também identifica como herética a ideia de que a Terra é móvel que e não é o centro do universo.
O TEXTO DA CONDENAÇÃO E DA ABJURAÇÃO DE GALILEU PELO SANTO OFÍCIO DE 1633
Condenação e abjuração de Galileu de 1633: «Nós dizemos, pronunciamos, sentenciamos e declaramos que vós, o referido Galileu, por causa dos assuntos aduzidos no julgamento, e por vós confessado tal como acima, vos tornastes, segundo julgamento do Santo Ofício, veementemente suspeito de heresia, nomeadamente de ter acreditado e mantido a doutrina ― que é falsa e contrária às sagradas e divinas Escrituras ― de que o Sol é o centro do universo e não se move de leste a oeste e que a Terra move-se e não é o centro do universo; e que uma opinião pode ser mantida e defendida como provável depois de ter sido declarada e definida como contrária à Sagrada Escritura; e que, consequentemente, incorrestes em todas as censuras e penalidades impostas e promulgadas nos cânones sagrados e noutras constituições, gerais e particulares, contra tais delinquentes. A partir do qual ficamos contentes que vós sejais absolvido, contanto que, primeiro, com um coração sincero e uma fé não fingida, abjurais, amaldiçoais e detestais diante de nós os erros e heresias acima mencionados e todos os outros erros e heresias contrários à Igreja Católica, Apostólica e Romana sob a forma a vos ser prescrita por nós.» (citação de John Daly, The Theological Status of Heliocentrism)
O próximo ano relevante para este assunto é 1664, e Alexandre VII era o papa reinante.
«Março de 1664: Papa Alexandre VII promulga o seu Index Librorum Prohibitorum Alexandri VII Pontificis Maximi jussu editus prefaciado por uma bula papal na qual ele ordena que todo o Índice seja considerado parte da própria bula e compartilhando directamente a sua autoridade papal. Este Índice inclui todas as condenações anteriores de livros geocêntricos [sic; Ele quer dizer heliocêntricos] em geral e em particular e é confirmado e aprovado com autoridade apostólica.
«1665: O Papa Alexandre VII publica um novo Índice no qual são proibidos “todos os livros e folhetos, periódicos, composições, consultas, cartas, glosas, opúsculos, discursos, respostas, tratados, impressos ou manuscritos, contendo e tratando os seguintes assuntos ou sobre os seguintes assuntos… a mobilidade da terra e a imobilidade do Sol.”» (John Daly, The Theological Status of Heliocentrism)
Então, permita-me resumir os factos cruciais que discutimos até agora:
1) em 1616, onze teólogos do Santo Ofício condenaram o heliocentrismo como herético com o conhecimento e aprovação do papa, mas sem uma especifica declaração procedente de sua autoridade suprema de ensinamento;
2) o Doutor da Igreja, São Roberto Belarmino concordou com a declaração do heliocentrismo como herética, e até informou Galileu de sua decisão;
3) a Congregação do Índice proibiu a publicação de escritos heliocêntricos;
4) em 1633, após a Inquisição ter investigado Galileu como suspeito de heresia, impeliu-o a fazer uma abjuração que denunciasse o heliocentrismo e considerasse a negação do geocentrismo como herética;
5) em 1664-1665, o Papa Alexandre VII promulgou por sua própria autoridade um Índice proibindo todos os escritos que favorecessem o heliocentrismo e que negavam o geocentrismo; este foi prefaciado por uma bula que declarava que o Índice fazia parte da bula e era dotada da sua autoridade papal.
Antes de dar uma conclusão sobre se algum desses actos é infalível ou se qualquer um deles constitui uma obrigação vinculativa para um católico rejeitar o heliocentrismo (Eu examinarei cada um individualmente próximo do final deste artigo), permita-me trocar as ferramentas e examinar esta questão em conjunção com a questão do baptismo de desejo, antes de dar mais relevância histórica ao status da posição teológica do geocentrismo.
Perguntemo-nos: o equivalente ao que lemos acima foi alguma vez feito em relação àqueles que negam a posição de «baptismo de desejo» ― a ideia de que uma pessoa pode salvar-se sem o Sacramento do Baptismo através do desejo deste? A resposta é absolutamente não, não chegou nem perto.
TODOS TÊM DE ADMITIR QUE HÁ UMA EVIDÊNCIA MUITO MAIS FORTE PARA A POSIÇÃO DE QUE A IGREJA CONDENOU OFICIALMENTE O HELIOCENTRISMO E A NEGAÇÃO DO GEOCENTRISMO DO QUE PARA A POSIÇÃO DE QUE CONDENOU OFICIALMENTE O «BAPTISMO DE DESEJO»
É apropriado aqui recordar dois dos argumentos mais populares que as pessoas trazem à tona em favor do baptismo de desejo. Um é a ideia de que a Igreja Católica condenou aqueles que neguem o baptismo de desejo «condenando» o Pe. Feeney em Suprema haec sacra, a carta de 1949 ao «Arcebispo» Richard Cushing, de Boston, do Santo Ofício. Esta posição é hoje amplamente mantida entre aqueles que professam ser «católicos tradicionais».
Suprema haec sacra foi uma carta ao «Arcebispo» Cushing em resposta à sua consulta sobre a pregação do dogma Fora da Igreja não há Salvação por parte do Pe. Feeney. Datada de 8 de Agosto de 1949, Suprema haec sacra respondeu de forma negativa sobre a pregação de Feeney e ensinou de forma positiva sobre o baptismo de desejo, incluindo o baptismo de desejo «implícito», inclusive para aqueles em «ignorância invencível», e para aqueles que não são «membros» da Igreja e para aqueles «que não pertencem ao corpo da Igreja Católica». Foi assinada por dois membros do Santo Ofício (Cardeais Marchetti-Selvaggiani e Ottaviani).
Com base nesta carta alegadamente do Santo Ofício, dezenas de «tradicionalistas» e toneladas de membros da seita Vaticano II acham que a Igreja Católica condenou oficialmente o Pe. Feeney por negar o baptismo de desejo.
A condenação do heliocentrismo, tenha em mente, foi aprovada por onze teólogos qualificadores do Santo Ofício na sua primeira avaliação em 1616. O heliocentrismo foi então condenado novamente por inúmeros actos da Sacra Congregação do Índice e por outro acto do Santo Ofício em 1633, o qual envolveu muitos mais teólogos e uma abjuração formal e texto de condenação que identificou qualquer negação da Terra como o centro do universo como heresia. Obviamente, portanto, se alguém fosse sustentar que a condenação do Pe. Feeney (na carta Suprema haec sacra do Cardeal Marcetti-Selvaggiani em 8 de Agosto de 1949) representa o ensinamento vinculativo da Igreja, como muitos fazem hoje, essa pessoa tem de necessariamente considerar que as numerosas declarações de que o heliocentrismo/a negação do geocentrismo são heréticas/falsas por parte do Santo Ofício, etc. também são vinculativas. De modo hipócrita, no entanto, muitos poucos dos defensores do baptismo de desejo que espalham por toda parte a falsa ideia de que a Igreja Católica condenou oficialmente o Pe. Leonard Feeney também dizem que a Igreja Católica condenou oficialmente o heliocentrismo ou a negação do geocentrismo durante a provação de Galileu. Na verdade, muitos desses mesmos defensores do baptismo do desejo «anti-Feeney» crêem no heliocentrismo e/ou rejeitam o geocentrismo. Isso representa apenas a primeira das grandes contradições na sua posição, e estamos apenas a começar. Isto é uma profunda hipocrisia e inconsistência teológica que não pode ser subestimada!
Assim, podemos e devemos dizer: qualquer pessoa que pense que Suprema haec sacra (a carta de 1949 contra o Pe. Feeney) prova que o ensinamento de Feeney não era católico ― por outras palavras, que «o Papa Falou» sobre essa questão ― que também não considera que todos os não-geocentristas estão em heresia, é uma fraude completa que não merece respeito por um católico. Isso inclui muitos membros da seita Vaticano II, mas também muitos sacerdotes «tradicionalistas» e «conservadores» (por exemplo, sacerdotes da SSPV, CMRI, alguns da SSPX, etc.), que amam condenar o Pe. Feeney, mas são em grande parte omissos sobre esta questão, ou dizem abertamente que pode-se manter o heliocentrismo ou negar o geocentrismo. Tenha isso em mente à medida que avançamos.
Em segundo lugar, vamos olhar para outro dos argumentos favoritos feito a favor da teoria do «baptismo de desejo». Muitos deles argumentam que, visto que Santo Afonso, um Doutor da Igreja, considerou que o baptismo de desejo é «de fide» (confira o meu livro Fora da Igreja Católica Não Há Absolutamente Salvação sobre este tema para a citação integral e discussão), isso significa que a Igreja ensina isso oficialmente. É impensável, dizem eles, que um Doutor da Igreja pudesse errar de forma tão significativa: ele não poderia considerar algo como «de fide» que não é. Veja como dois defensores do baptismo de desejo expressaram o seu argumento num fórum de discussão:
Dom Pook, 11 de Fevereiro de 2007: «O facto de um doutor da Igreja ter errado em certos pontos de teologia não significa que Santo Afonso possa estar errado no que se refere ao baptismo de desejo. Se Santo Afonso diz que o baptismo de desejo é um ensinamento que é de fide, então é de fide. Não acredito, nem é possível, que um doutor da Igreja possa ter ensinado o que é de facto um erro como um ensinamento de fide (Alguém está em desacordo?). Basta conhecer os requisitos da Igreja para tornar alguém um doutor da Igreja para chegar a essa conclusão.»
A sua posição foi apoiada publicamente pelo defensor de baptismo de desejo e apoiante da SSPX, John Lane ― sim, ele é um defensor e benfeitor da SSPX apesar de alegar ser um sedevacantista:
John Lane, 19 de Março de 2007: «Caro Dom, eu concordo plenamente. Uma coisa é dizer que um Doutor pode ter errado (e quem iria querer fazer tal afirmação???) ― outra coisa é dizer plenamente que todos os teólogos por centenas de anos erraram sem ter sido corrigidos, e que um Doutor da Igreja rotulou esse erro como de fide!!! A primeira é meramente absurda ― ou pelo menos, geralmente tal; a última é uma ofensa à própria Igreja…»
Repare que os defensores de baptismo de desejo declaram que é impensável que um Doutor da Igreja cometa tal erro ― isto é, que considere algo como «de fide» (de fé) que não é. (Nós sempre mantivemos o contrário. Assinalámos ― como pode ser visto no meu livro sobre o tema ― que a posição de Santo Afonso baseou-se num entendimento equivocado da Sess. 6, Cap. 4 do Concílio de Trento, além de ele não ter reconhecido, naquele momento, o verdadeiro status de certos documentos que ele acreditava favorecer o baptismo de desejo. Observamos ainda que os argumentos que ele avançou sobre este tema são claramente erróneos, como aquele em que ele erroneamente a parte do Concílio de Trento em uma de suas passagens.) Embora os erros de Santo Afonso estejam documentados, o Sr. Pook declara arbitrariamente que é impossível que Santo Afonso tenha cometido um erro nesta matéria. Lane dá corpo a esse sentimento questionando se alguém poderia acusar um Doutor da Igreja de erro. Ele afirma que alguém poderia dizer que um doutor poderia ter errado, mas «e quem iria querer fazer tal afirmação?» Guiado pelo espírito diabólico que faz com que uma pessoa seja infectada pela adoração do homem, Lane permanece inconsciente do facto de muitos erros dos Doutores da Igreja terem sido documentados, enquanto Pook decide arbitrariamente quais são os assuntos sobre os quais eles podem errar.
Agora, para ampliar a afirmação de Lane de que é «uma ofensa à Igreja» sugerir que um doutor da Igreja poderia rotular como de fide algo que não é, vejamos o que São Roberto Belarmino ― um doutor da Igreja ― disse sobre a noção de que o Sol é o centro fixo do universo e que a Terra não é. Como já foi tratado, São Roberto Belarmino estava íntimamente envolvido com a aprovação da decisão de 1616 de onze teólogos qualificadores do Santo Ofício de que o heliocentrismo é contra a fé. Abaixo constam as suas palavras:
SÃO ROBERTO BELARMINO MANTINHA QUE O GEOCENTRISMO É DE FIDE, MAS ELE FOI REFUTADO POR PAPAS POSTERIORES; ISTO CRIA PROBLEMAS DEVASTADORES PARA ARGUMENTOS POPULARES A FAVOR DE BAPTISMO DE DESEJO
São Roberto Belarmino, Carta a Paolo Antonio Foscarini: «Mas querer afirmar que o Sol realmente está fixado no centro dos céus e que só gira em torno de si mesmo [gira em torno de seu eixo] sem viajar de leste a oeste e que a Terra está situada na terceira esfera e gira com grande velocidade ao redor do sol, é uma coisa muito perigosa, não só por irritar todos os filósofos e teólogos escolásticos, mas também por prejudicar a nossa santa fé e tornar as Sagradas Escrituras inexactas…
«Segundo. Eu digo que, como sabeis, o Concílio (de Trento) proíbe a explanar as Escrituras de modo contrário ao consenso comum dos santos Padres. E se Vossa Reverência lê não apenas os Padres, mas também os comentários dos escritores modernos sobre Génesis, Salmos, Eclesiastes e Josué, ides concluir que todos concordam em explicar literalmente (ad litteram) que o sol está nos céus e se move rapidamente em torno da terra, e que a terra está longe dos céus e permanece imobilizada no centro do universo. Agora, considerai se acaso a Igreja poderia encorajar dar às Escrituras um sentido contrário aos santos Padres e a todos os comentadores latino e gregos.»
«Também não pode ser respondido que esta não é uma questão de fé, pois, se não é uma questão de fé do ponto de vista do assunto, é por parte dos que falaram. Seria tão herético negar que Abraão teve dois filhos e Jacó doze, quanto seria negar o nascimento virginal de Cristo, pois ambos são declarados pelo Espírito Santo através da boca dos profetas e apóstolos.»
Vemos muito claramente que São Roberto Belarmino considerava que o geocentrismo é de fide. Ele afirmou ainda que era a posição de todos os teólogos e de todos os padres. Este ponto em relação ao ensinamento dos teólogos é relevante porque a mesma multidão de defensores do baptismo de desejo sustenta que o ensinamento comum dos teólogos também representa o ensinamento vinculativo da Igreja Católica. (Esta posição é refutada na secção 19 do meu livro, Fora da Igreja Católica Não Há Absolutamente Salvação, mas o ponto aqui é que São Roberto Belarmino sustentava o geocentrismo como de fide e não apenas o ensinamento «comum» dos teólogos, mas o ensinamento unânime dos teólogos.) Como outro escritor sobre esta questão afirmou:
Paula Haigh, a Heresia de Galileu: «O Cardeal Belarmino assegura-nos que o consentimento dos padres e dos seus comentadores é unânime em manter uma visão geocêntrica e geostática do universo baseada na Sagrada Escritura (n.º6).»
Alguns tentam argumentar que São Roberto Belarmino não considerou necessariamente que o geocentrismo é de fide citando a última parte da carta de São Roberto Belarmino ao Pe. Foscarini. Na última parte dessa carta, São Roberto Belarmino supostamente indica que se poderia manter o heliocentrismo como uma hipótese, mas não como uma posição comprovada. Mas mesmo o defensor do baptismo de desejo John Daly descarta esse argumento com os seguintes pontos:
«Ward citou a carta de São Roberto Belarmino ao Padre Foscarini em defesa desta opinião, pois o santo diz não há objecções em escrever sobre heliocentrismo como uma hipótese. Mas esse facto não ajuda no argumento porque (i) é bastante claro a partir do contexto e do resto do que sabemos do pensamento de Belarmino sobre o assunto que ele estava se referindo apenas a uma hipótese per impossibile, útil, talvez, como base para fazer cálculos práticos, mas de modo algum reconhecendo o heliocentrismo como potencialmente verdadeiro, e (ii) esta carta não foi escrita em 1624 como Ward alegou em seu primeiro artigo na Dublin Review sobre este assunto (o santo autor já estava morto fazia três anos por essa data), nem em 1620 como ele alegou em seu segundo artigo, mas em 1615, antes que a Santa Sé se pronunciasse definitivamente sobre o tema; e nenhuma declaração de Belarmino pode ser encontrada após os decretos de 1616 que poderiam dar a aparência por qualquer exercício de imaginação que fosse de atribuir até mesmo possibilidade hipotética ao sistema heliocêntrico.» (John Daly, The Theological Status of Heliocentrism)
Então, para resumir: o ponto final de Belarmino para Foscarini, que alguns afirmam dar endosso ao heliocentrismo como uma hipótese, foi escrito no contexto de usar a posição heliocêntrica apenas para fazer cálculos, não como se o heliocentrismo pudesse ser verdadeiro. Além disso, mesmo se alguém quiser argumentar que há uma ambiguidade na sua carta ― uma carta que, como citado acima, considera a negação do geocentrismo como «herética» ― a declaração de Belarmino em questão foi feita em 1615, antes de os onze teólogos do Santo Ofício terem condenado o heliocentrismo. Depois disso, não há nada de Belarmino que sugira que, na sua opinião, uma pessoa é livre para manter o heliocentrismo como potencialmente verdadeiro. Ele obviamente concordou com a decisão dos onze membros do Santo Ofício, que declarou ser o heliocentrismo falso e herético. É por isso que o São Roberto Belarmino foi quem convocou «Galileu à sua casa e diante de testemunhas [transmitiu] as ordens do Papa, ordenando-o em nome do Papa e de toda a Congregação do Santo Ofício a abandonar a posição em questão [heliocentrismo] e a não mais mantê-la, ensiná-la ou defendê-la sob pena de ser julgado pelo Santo Ofício. Galileu promete[u] obedecer.»
Logo, é claro que São Roberto Belarmino sustentava que o geocentrismo é de fide, e a negação de tal herética. Com esses factos sendo estabelecidos, agora é hora de apresentar a evidência que, quando considerada com todos os factos anteriores, vincula um dos principais pontos que estou a tentar estabelecer neste artigo. Considerando tudo o que foi dito, a seguinte evidência torna-se absolutamente devastadora (um verdadeiro golpe de nocaute) aos principais defensores do baptismo de desejo e aos seus argumentos.
NUMA ENCÍCLICA, O PAPA BENTO XV DECLARA QUE A TERRA PODE NÃO SER O CENTRO DO UNIVERSO, CONTRARIANDO OS ONZE TEÓLOGOS DO SANTO OFÍCIO DE 1616, A SENTENÇA DE 1633 DO SANTO OFÍCIO E O QUE SÃO ROBERTO BELARMINO ENSINOU SER DE FIDE
Papa Bento XV, In Praeclara Summorum n.º4, 20 de Abril de 1921: «Se o progresso da ciência demonstrou posteriormente que essa concepção do mundo não se baseava em nenhum fundamento seguro, que as esferas imaginadas pelos nossos antepassados não existiam, que a natureza, o número e o curso dos planetas e das estrelas não são, na verdade, como se pensava que eram, ainda assim manteve-se o princípio fundamental de que o universo, seja qual for a ordem que o sustenta em suas partes, é a obra do sinal criador e conservador do Deus Omnipotente, que move e governa tudo, e cuja glória risplende in una parte più e meno altrove; e embora essa Terra em que vivemos possa não ser o centro do universo, como como se pensava em tempos passados, era a cena da felicidade original de nossos primeiros antepassados, testemunho da sua infeliz queda, como também da Redenção da humanidade através da Paixão e Morte de Jesus Cristo.»
Aqui vemos o Papa Bento XV, numa encíclica de 1921, a declarar que «essa Terra em que vivemos possa não ser o centro do universo, como se pensava em tempos passados». Em todas as discussões da questão com as quais estou familiarizado, nunca vi a citação acima citada do Papa Bento XV sendo trazida à tona. Pessoas como John Daly, Solange Hertz, Paula Haigh, etc., que dedicaram muito tempo a essa questão, obviamente desconheciam esta citação.
É uma citação que encontrei em determinado momento no meu estudo detalhado de cada encíclica papal desde 1740. Agora que foi divulgada neste artigo, podeis esperar vê-la citada por outros no futuro, provavelmente sem menção de onde eles a viram pela primeira vez. Menciono que esses autores desconheciam esta citação do Papa Bento XV porque acontece com bastante frequência de nos depararmos com uma citação dos papas ― ou suma heresia particular dos antipapas do Vaticano II ― que é surpreendente ou relevante para um determinado tópico, e depois de esta outros fazerem-na circular, eles nunca mencionam a fonte de pesquisa original.
Solange Hertz, The Scientific Illusion: «Como estamos cientes, Galileu abjurou em ordem a evitar excomunhão, e até hoje a Igreja não levantou a sua condenação da teoria herética dele, que permanece como tão desprovida de provas como sempre.»
Paula Haigh, Was It/Is It Infallible, pág. 20: «Os teólogos modernos nunca abordaram o problema posto por esta Bula de Alexandre VII. Se tivessem, eles precisariam admitir a sua direta autoridade papal e procurar algum documento subsequente por um papa subsequente que fosse derrogado formalmente e especificamente [isto é, anulado] a Bula de 1664. Mas jamais foi encontrado ou produzido tal documento.»
Vemos que eles permanecem ignorantes de declarações papais directas que questionam a visão geocêntrica do universo. Embora a citação acima citada do Papa Bento XV certamente não aborde a Bula de Alexandre VII (uma bula que irei discutir), obviamente avança uma posição que permite a crença em algo diferente do geocentrismo. (Eventualmente, chegarei à minha opinião sobre o que a Igreja realmente ensina ― ou não ensina ― sobre este assunto à luz dos factos que vimos até agora, mas primeiro quero continuar com o exame deste assunto em conjunto com a questão do «baptismo de desejo».)
Então, depois de examinar minuciosamente a citação do Papa Bento XV sobre a Terra possivelmente não ser o centro do universo, «como se pensava em tempos passados», o enorme problema para os principais defensores de baptismo de desejo deve ser muito óbvio.
OU UM PAPA NUMA ENCÍCLICA CONTRADISSE ALGO QUE É DE FIDE E VINCULATIVO, OU SÃO ROBERTO BELARMINO, MUITOS TEÓLOGOS DO SANTO OFÍCIO E A SENTENÇA DO OFÍCIO SANTO DE 1633 CONTRA GALILEU ESTÃO COMPLETAMENTE ERRADOS QUE GEOCENTRISMO É DE FIDE E VINCULATIVO
Existem apenas duas possibilidades: 1) São Roberto Belarmino e os membros do Santo Ofício estavam correctos que o geocentrismo é de fide; nesse caso, o Papa Bento XV estava errado (e estava a ensinar heresia) ao afirmar que a Terra pode não ser o centro do universo; ou 2) o Papa Bento XV estava correcto de que a questão ainda não tinha sido resolvida (e que a Terra pode não ser o centro) e São Roberto Belarmino, e muitos teólogos do Santo Ofício e a sentença do Santo Ofício em 1633 contra o Galileu, etc., estavam errados ao declarar o heliocentrismo como herético e considerar o geocentrismo como sendo de fide. Por favor, sigai-me enquanto examino as ramificações de cada possibilidade, pois uma consideração cuidadosa desta questão ajuda grandemente a elucidar os parâmetros da infalibilidade da Igreja, precisamente o que constitui fidelidade ao Magistério, e o que por si só determina definitivamente «o ponto de vista da Igreja».
AS CONSEQUÊNCIAS CASO O NÚMERO 1 FOR VERDADEIRO, NOMEADAMENTE, SE O GEOCENTRISMO DEVE SER CONSIDERADO COMO DE FIDE E HELIOCENTRISMO COMO HERÉTICO
Suponhamos, por motivo argumentativo, que o n.º1 é verdadeiro: São Roberto Belarmino e os membros do Santo Ofício estavam correctos que o geocentrismo é de fide. Como já vimos, isso deveria ser a posição dos principais defensores do baptismo de desejo; pois eles afirmam que «é uma ofensa à Igreja» pensar que um doutor da Igreja poderia rotular como de fide algo que não é. Se eles não sustentam a posição n.º1, são hipócritas monstruosos.
Se o n.º1 é verdadeiro, isso significa que o Papa Bento XV estava a ensinar heresia na sua encíclica. Isso também significa que ele e vários outros papas (como será explicado abaixo) ignoravam a o verdadeiro estatuto teológico do geocentrismo. No seu artigo The Theological Status of Heliocentrism, John Daly observa que, em 16 de abril de 1757 ― 164 anos antes do Papa Bento XV ― o Papa Bento XIV suspendeu os decretos da Congregação do Índice dos Livros Proibidos que interditavam obras que contradiziam o geocentrismo. Outros papas seguiram o Papa Bento XIV ao permitir a publicação de obras heliocêntricas:
«16 de Abril de 1757: O erudito-papa Bento XIV, em reconhecimento ao novo estatuto do heliocentrismo sustentado pelo mundo académico desde os escritos de Isaac Newton, suspende os decretos da Congregação do Índice contra obras heliocêntricas.
1820: Canon Settele requere o Imprimatur romano de Mgr. Anfossi para autorizar a publicação da sua obra Elements d’Astronomie abertamente heliocêntric. Anfossi recusa, mas Settele apela ao Papa Pio VII que sustenta o apelo e permite a publicação.
11 de setembro de 1822: A Sagrada Congregação da Inquisição decide que a impressão de livros que ensinam a mobilidade da Terra seria a partir de então permitida em Roma.» (John Daly, The Theological Status of Heliocentrism)
Logo, se o n.º1 é verdadeiro, isso não significa apenas que o Papa Bento XV estava a ensinar heresia na sua encíclica In Praeclara Summorum, mas que vários papas permitiram que fosse ensinada heresia mediante abolição de decretos que proibiam a sua publicação. Por exemplo, o Papa Pio VII aprovou o decreto mencionado acima (de 11 de Setembro de 1822) que permitiu a impressão de livros que ensinavam o movimento da Terra. Isso significa que aqueles papas que aboliram esses decretos ignoravam o estatuto teológico do geocentrismo.
Ora, aceitar que esses papas estavam errados ― o que devemos fazer se acreditarmos que São Roberto Belarmino e os teólogos do Santo Ofício estavam correctos sobre o geocentrismo, por outras palavras, se aceitarmos os argumentos dos defensores do baptismo de desejo sobre a «autoridade» dos doutores da Igreja, etc. ― é, na verdade, provar que São Roberto Belarmino poderia estar errado. Pois, se vários papas pudessem ter errado sobre o estatuto teológico de um ensinamento que realmente é de fide, então certamente um mero doutor da Igreja poderia ter errado na sua avaliação de que esse ensinamento é de fide.
Isto é porque «pela própria primazia apostólica que o Pontífice Romano, como sucessor de Pedro, o chefe dos Apóstolos, mantém a Igreja universal, o supremo poder do Magistério também é compreendido…» (Concilio Vaticano I, Constituição dogmática sobre a Igreja, Cap. 4, Denz. 1832) Ou seja, um papa não exerce o supremo poder do Magistério em todos os seus actos, mas ele é quem o possui. O supremo poder do Magistério não é detido por teólogos ou doutores da Igreja. Se um papa pudesse estar errado e pudesse ter falhado em reconhecer que algo é de fide ― algo que, aliás, sabemos que ocorreu porque os papas deram a sua aprovação (embora não de forma solene) às decisões do Santo Ofício em 1616 e 1633! ― então, necessariamente, um mero santo ou teólogo ou doutor da Igreja poderia ter errado em considerar algo como de fide. Portanto, seja qual for a forma em que perspectivemos a questão, o argumento de que «visto que Santo Afonso diz que baptismo de desejo é um ensinamento é de fide, então tem de ser verdadeiro», está fora de questão. Pois, mesmo que aceitemos a possibilidade n.º1, que São Roberto Belarmino estava correto que o geocentrismo é de fide, isso significa que papas posteriores a ele não reconheceram ou compartilharam essa avaliação. Se eles pudessem ter errado, então é possível, e não impossível, que um doutor da Igreja pudesse ter errado também.
AS CONSEQUÊNCIAS SE O NÚMERO 2 FOR VERDADEIRO, NOMEADAMENTE, SE O PAPA BENTO XV ESTAVA CORRECTO QUE A QUESTÃO AINDA NÃO FOI RESOLVIDA (E QUE A TERRA PODE NÃO SER O CENTRO)
Agora, mudemos de engrenagem e suponhamos que o n.º2 é verdadeiro: nomeadamente, que o Papa Bento XV estava correcto ― juntamente com os outros papas, como o Papa Bento XIV, que permitiram a publicação de obras heliocêntricas ― quanto à questão ainda não ter sido resolvida (e que a Terra pode não ser o centro), com base no argumento de que as decisões passadas não eram infalíveis, ensinamentos irreformáveis sobre a fé; e, portanto, que São Roberto Belarmino, os membros do Santo Ofício e a sentença do Santo Ofício em 1633 contra Galileu estavam simplesmente errados por declararem o heliocentrismo como herético e por considerarem o geocentrismo como sendo de fide, e por terem conseguido que Galileu abjurasse a heresia do movimento da Terra.
Nesse caso, percebemos imediatamente que a infalibilidade da Igreja é muito mais limitada do que muitos dos chamados especialistas sustentaram. Percebemos imediatamente que um doutor da Igreja, vários membros do Santo Ofício, inúmeros outros teólogos, decretos oficiais que emanam de várias Congregações do Vaticano que operamo sob o papa, incluindo o Ofício da Inquisição (o Ofício encarregado de destruir heresia), estavam todos enganados ao declarar o heliocentrismo como herético e o geocentrismo como de fide. Nós vemos que a posição dessa verdade tem sido há séculos um mistério, embora muitos papas e um doutor da Igreja se tenham envolvido com o assunto.
Nesse caso, vemos que os argumentos avançados por defensores de baptismo de desejo ― que a Igreja necessariamente ensina «baptismo de desejo» porque Santo Afonso, doutor da Igreja, disse que era de fide e porque uma carta de dois membros de o Santo Ofício condenou o Pe. Feeney ― são directamente (não indiretamente, como no caso de o n.º1 ser verdadeiro) demolidos. Pois, neste caso, temos um paralelo directo: um doutor da Igreja, São Roberto Belarmino, estava errado ao rotular o geocentrismo como de fide e considerar a negação deste como herética; e temos vários actos do Santo Ofício aprovados por mais de dez teólogos (não apenas dois, no caso do Pe. Feeney), que estavam errados em condenar o heliocentrismo como heresia e ensinar o geocentrismo como de fide.
Logo, aqueles que permaneceram neste artigo até agora devem enxergar facilmente que os factos aqui abordados provam que os argumentos que foram repetidamente trazidos à tona por defensores do baptismo de desejo de fontes menos do que dogmáticas (por exemplo, de teólogos, de Santo Afonso, da carta contra o Pe. Feeney) ― argumentos que eles afirmam que representam definitivamente a mente oficial da Igreja em favor de baptismo de desejo ― não passam de mentiras ilusórias que não comprovam de forma alguma que a Igreja ensina tais coisas. Eles foram feitos por homens que não têm um verdadeiro entendimento sobre o que ― quando uma questão teológica torna-se séria ― nos deve fornecer o nosso entendimento da «mente da Igreja». Agora que esses homens ― que criticaram, assediaram e tentaram intimidar certos católicos que rejeitam o baptismo do desejo ― foram totalmente refutados em alguns de seus pontos favoritos, eles deveriam se envergonhar de ter atacado a verdade e ter sido tão ludibriados por má vontade própria.
A verdade é que, independentemente do lado que adoptais, os factos neste artigo servem como uma marcante reivindicação dos católicos que mantiveram, e não sem frequente e servera resistência ou criticismo, que a verdadeira fidelidade ao Magistério, a verdadeira fidelidade à mente da Igreja, e a verdadeira fidelidade ao ensinamento católico, existem na obediência ao ensinamento das definições dogmáticas (por exemplo, aquelas que tratam da necessidade absoluta do baptismo de água) e a claras declarações dos próprios papas que tal e tal sempre foi mantido pela Igreja Católica. Esses pontos demonstram que, mesmo que algo seja ensinado por um santo, um doutor da Igreja que diz que é «de fide», o ensinamento comum ou mesmo dominante de teólogos por até centenas de anos, e até mesmo decisões do Santo Ofício não aprovadas especificamente por um papa com linguagem autoritária, não são necessariamente infalíveis, vinculativos ou verdadeiros ― ou, no mínimo, vários papas válidos não conseguiram reconhecer tal infalibilidade.
ORA, QUAL É A CONCLUSÃO APROPRIADA SOBRE O VERDADEIRO ESTATUTO TEOLÓGICO DO GEOCENTRISMO?
Agora, viremos a página das implicações hipotéticas que necessariamente surgem se cada posição for considerada verdadeira e passemos a examinar qual é realmente a verdadeira.
O ENSINAMENTO INFALÍVEL DA IGREJA
Para avaliar se algo é um ensinamento infalível sobre fé ou moral (que é a questão em discussão), devemos ser claros quando a Igreja ensina infalivelmente sobre fé ou moral. Os requisitos definidos pelo Vaticano I para um pronunciamento ex cathedra por um Pontífice Romano são citados abaixo:
Papa Pio IX, Concílio Vaticano I, 1870, Sessão 4, Cap. 4:«… o Pontífice Romano, quando pronuncia-se ex cathedra [da Cátedra de Pedro], isto é, quando executa o cargo de pastor e professor de todos os cristãos de acordo com a sua suprema autoridade apostólica, explica uma doutrina de Fé ou moral a ser crida pela Igreja Universal… opera com aquela infalibilidade com a qual o divino Redentor quis que a Sua Igreja fosse instruída ao definir doutrinas acerca de Fé e moral; e, então, tais definições do Pontífice Romano de si próprio, e não do consenso da Igreja, são inalteráveis.» (Denz. 1839)
Como vemos, para que um pronunciamento seja promulgado ex cathedra (infalivelmente desde a cátedra de São Pedro), um papa deve 1) explicar uma doutrina de fé ou moral, 2) em virtude da sua autoridade apostólica, 3) para ser mantido pela Igreja universal. Se houvesse outras maneiras de um papa ensinar infalivelmente, o Vaticano I as teria definido. A única outra maneira, indicada pelo Vaticano I, de que o Magistério ensina infalivelmente sobre fé ou moral, está no que é chamado de Magistério ordinário e universal.
Em quê exactamente constitui o ensinamento do Magistério ordinário e universal nunca foi definido e, portanto, é uma questão de debate. Contudo, pode-se dizer de forma segura que o Magistério ordinário e universal é exercido quando um papa afirma ele próprio especificamente que tal ensinamento sempre foi mantido pela Igreja em linguagem que não é ex cathedra. Por exemplo, se um papa declarou em uma bula ou uma encíclica que «a Igreja sempre considerou que a Terra é o centro do universo», então, seria, em minha opinião, um exemplo do ensinamento do Magistério ordinário e universal. Mas isso nunca ocorreu.
Com esses pensamentos sobre o ensinamento infalível da Igreja tendo sido estabelecidos, comecemos por rever cada um dos cinco pontos principais que são apresentados para provar que o geocentrismo é o ensinamento vinculativo da Igreja Católica:
EXAMINANDO ESPECIFICAMENTE TODOS OS ACTOS/ARGUMENTOS PARA VER SE ALGUM OU TODOS CONSTITUEM ENSINAMENTO INFALÍVEL
1) Em 1616, onze teólogos qualificadores do Santo Ofício condenaram o heliocentrismo como herético com o conhecimento e aprovação do papa, mas sem uma declaração específica emanando da sua suprema autoridade de ensinamento.
Esta foi uma declaração de onze teólogos empregados pelo Santo Ofício. É claro que não é infalível. Embora o papa da época (Paulo V) estivesse ciente dessa decisão e a tenha aprovado, ele não a aprovou solenemente ou mesmo por escrito. Também deve ser enfatizado que existe uma distinção importante entre os actos das Congregações Romanas (por exemplo, actos do Santo Ofício) que são aprovados por um papa in forma communi (em forma comum) e aqueles que são aprovados in forma specifica (em forma específica). A Enciclopédia Católica explica a diferença:
«No que diz respeito ao valor doutrinal dos Decretos do Santo Ofício, deve-se observar que os canonistas distinguem dois tipos de aprovação de um acto de inferior por superior: primeiro, aprovação em forma comum (in forma communi), como às vezes é chamada, o que não retira do acto a sua natureza e qualidade de acto do inferior. Assim, por exemplo, os decretos de um concílio provincial, embora aprovados pela Congregação do Concílio ou pela Santa Sé, permanecem sempre decretos conciliares provinciais. Em segundo lugar, a aprovação específica (in forma specifica), que retira do acto aprovado o seu carácter de um acto do inferior e o torna o acto de um superior que o aprova. Esta aprovação é entendida quando, por exemplo, o papa aprova um Decreto do Santo Ofício ex certa scientia, motu proprio ou plenitudine suae potestatis.» (The Catholic Encyclopedia, Vol. 13, 1908, p. 138.)
Os actos de Congregações Romanas ou membros do Santo Ofício que são aprovados apenas em forma comum não são infalíveis. É importante ter em mente alguns pontos que se seguem. Eu vou expandir isso mais enquanto eu prossigo. Agora que é claro que o ponto número 1 não é infalível, vamos passar para o segundo argumento.
2) O doutor da Igreja, São Roberto Belarmino, concordou com a declaração do heliocentrismo como herético, e ele até informou Galileu da decisão.
Isso também está claramente aquém dos requisitos do Vaticano I, conforme discutido acima. O ensinamento infalível do Magistério é investido em papas, não em doutores da Igreja, apesar do que muitos nos queiram fazer crer.
Papa Bento XIV, Apostolica (n.º6), 26 de junho de 1749: «O parecer de um único, ainda que santo e celebradíssimo Doutor, deve em todo o caso ceder ao sentimento da Igreja.»
Papa Pio XII, Humani generis (n.º21), 12 de agosto de 1950: «E o divino Redentor confiou a interpretação autêntica desse depósito não a cada um dos fiéis, nem mesmo aos teólogos, mas somente à Autoridade Magisterial da Igreja.»
3) A Congregação do Índice proibiu a publicação de obras heliocêntricas
Esta é uma decisão disciplinar de uma Congregação Romana. E mesmo que esta Congregação Romana incluísse razões de fé para a sua decisão, continua a não ser um acto infalível da Igreja ou do Pontífice Romano sobre fé ou moral, como explicado no n.º1 sobre actos de Congregações Romanas aprovados em forma comum. Isso certamente mostra que os homens da Igreja consideravam na altura que o geocentrismo era de fide, mas estamos analisar se a própria Igreja aplicou a sua autoridade de ensinamento infalível a essa posição. Este facto não prova que isso aconteceu. É por isso que os papas foram capazes de reverter essa decisão disciplinar algumas centenas de anos depois, como já foi abordado. A resposta para o próximo ponto também elucida mais essa questão.
4) Em 1633, após o Santo Ofício da Inquisição ter investigado Galileu como suspeito de heresia, conseguiram que ele fizesse uma abjuração que denunciasse o heliocentrismo e considerasse a negação do geocentrismo como herética.
É verdade que o Papa Urbano VIII foi a favor da decisão de 1633 e ordenou a sua ampla circulação. Mas ele não ordenou que esta tem de ser aceite pela Igreja universal, que é um dos requisitos para uma declaração ex cathedra. Novamente, isto certamente mostra que os clérigos da época consideravam a negação do geocentrismo como herética, mas não mostra que a infalível autoridade docente da Igreja foi exercida para promulgar essa posição. A fim de elucidar mais a questão da autoridade ou a falta de decisões promulgadas por Congregações Romanas e ofícios ou tribunais da Inquisição, é muito valioso observar o caso de Santa Joana d'Arc nesse contexto.
O JULGAMENTO DE SANTA JOANA D'ARC TRAZ LUZ SOBRE A AUTORIDADE DO SANTO OFÍCIO E DOUTRAS CONGREGAÇÕES ROMANAS E, PORTANTO, SOBRE A FALTA DE AUTORIDADE NAS DECISÕES CONTRA GALILEU
Em relação à questão do que constitui «fidelidade à Igreja», é extremamente relevante considerar o caso de Santa Joana d'Arc. Aqueles que estão familiarizados com a sua história sabem que Santa Joana d'Arc foi uma santa extraordinário cujas acções incomuns na França no século XV a tornaram famosa, mesmo entre os não-católicos de hoje. Depois de ser chamada por Deus e dirigida por vozes sobrenaturais para auxiliar o Rei da França a expulsar da França o invasor inglês, foi capturada pelos ingleses, condenada por um tribunal da Inquisição e depois queimada na fogueira como uma herege. (A propósito: a resposta à pergunta por que Deus interveio milagrosamente para favorecer os exércitos de um país católico (França) em detrimento de outro (Inglaterra) reside, creio eu, no facto de que Deus previu que um século depois de Joana o novo rei da Inglaterra, o rei Henrique VIII, mergulharia o país da Inglaterra em cisma e teria levado a França com ele se a Inglaterra tivesse conquistado a França. Desse modo, Ele usou Santa Joana para salvar a França do protestantismo com antecedência. Isso fornece apenas mais um exemplo de que Deus detesta o protestantismo.) O veredicto do tribunal da Inquisição que condenou Joana d'Arc como uma herege não era infalível, é claro. Foi derrubado posteriormente. Santa Joana d'Arc foi beatificada em 1909 e canonizada em 1915.
É importante lembrar, no entanto, que Santa Joana d'Arc foi condenada como uma herege por um tribunal da Inquisição. O Santo Ofício, lembre-se, é meramente o Supremo Tribunal da Inquisição. O seu nome oficial é: Sacra Congregatio Romanae et Universalis Inquisitionis seu sancti officii. O Santo Ofício da Inquisição foi estabelecido pelo Papa Paulo III em 21 de Julho de 1542. Portanto, a pergunta deve ser feita: se outros tribunais da Inquisição são falíveis, como o que condenou Joana d'Arc, há algo qualitativamente diferente no Santo Ofício, o Supremo Tribunal da Inquisição em Roma, que torne infalíveis as decisões dos seus teólogos e cardeais? Em relação à infalibilidade, a única diferença entre o Santo Ofício da Inquisição e os segmentos locais é que o papa é o chefe do Santo Ofício. Assim, qualquer infalibilidade que um acto do Santo Ofício (ou de alguma outra Congregação Romana) poderia possuir seria proveniente da sua relação com o papa. Por isso, novamente chegamos à importante distinção entre actos do Santo Ofício (e doutras Congregações Romanas) que são aprovados em forma comum e aqueles que são aprovados em forma específica ― a distinção entre as decisões que um papa aprova, mas que não herdam a sua autoridade especial e as que ele aprova com a sua autoridade especial.
MAIS SOBRE A DISTINÇÃO ENTRE ACTOS DE CONGREGAÇÕES ROMANAS APROVADOS EM FORMA COMUM E OS QUE SÃO APROVADOS EM FORMA ESPECÍFICA
Se um acto do Santo Ofício é aprovado por um papa apenas em forma comum ― assim como todos os actos contra Galileu, incluindo o acto de 1633 do Santo Ofício ― então, do ponto de vista da infalibilidade, teria o mesmo grau de autoridade que qualquer declaração que o papa faça ou com a qual ele concorde. Qualquer afirmação que um papa faça ou concorde é infalível? Obviamente que não, como muitos exemplos da história da Igreja provam. Este tipo de declaração feita ou concordada por um papa, que não atende aos requisitos de uma definição dogmática ou de uma declaração clara sobre o que a Igreja sempre manteve, deve ser respeitada, ao menos que contradiga claramente algo de maior autoridade ou um facto conhecido; mas não possui infalibilidade. Esta seria a conclusão adequada sobre a autoridade dos actos do Santo Ofício. Os actos do Santo Ofício que são aprovados por um papa apenas em forma comum devem ser considerados, respeitados e obedecidos ao menos que contradigam um facto conhecido ou algo de maior autoridade; mas estes não são infalíveis, a não ser se, ao aprová-los, o próprio papa acrescente a sua própria autoridade especial aprovando-os de forma específica. Esta posição segue logicamente quando se considera a história da revelação divina.
Um papa possui infalibilidade porque Jesus Cristo conferiu suprema autoridade na Igreja sobre São Pedro e seus sucessores na Cátedra. A promessa de Cristo a um verdadeiro papa não é que ele não possa errar de forma alguma. É uma promessa de que o papa não pode errar quando vincula a Igreja universal a crer em algo sobre fé ou moral em virtude da sua suprema autoridade apostólica. Congregações Romanas não foram instituídas até o século XVI. O Santo Ofício, como mencionado acima, foi instituído pelo Papa Paulo III em 21 de julho de 1542. Os cardeais que ajudam o papa não foram incluídos, é claro, na promessa original a São Pedro de que sua fé não falte (Lc. 22:32). Esta foi uma promessa feita a São Pedro apenas, em virtude do oficio que Cristo conferiria a ele e a seus sucessores. Sustentar que as decisões do Santo Ofício aprovadas por um papa meramente na forma comum são infalíveis, logicamente exigiria que uma pessoa mantivesse que os associados ao Bispo de Roma na Igreja primitiva (por exemplo, o círculo interno do clero em Roma nos primeiros séculos) eram infalíveis nas suas decisões sobre questões católicas se o papa concordasse com elas. Obviamente, a Igreja não ensina isso. Vale ressaltar que o Santo Ofício não tem jurisdição sobre os cardeais (Enciclopédia Católica, Vol. 13, 1913, p. 138). Para que algo seja infalível, de acordo com o Vaticano I, deve vincular todos os cristãos.
Alguns tentariam responder a esta posição, a respeito de actos de Congregações Romanas aprovados apenas em forma comum não serem infalíveis, tal como o Pe. William Roberts (mais sobre ele à frente), citando um caso durante o reinado do Papa Pio IX. Após as obras de um tal de Anton Guenther terem sido condenadas pela Sagrada Congregação do Índice com a aprovação do papa em forma comum, alguns questionaram se eles estavam obrigados a aderir à condenação. O Papa Pio IX respondeu com um breve relatório ao Arcebispo de Colónia, datado de 15 de Junho de 1857. Pio IX respondeu que o decreto da Sagrada Congregação do Índice, aprovado por ele em forma comum, deveria ter bastado para que todos tenham decidido a matéria.
Ao analisar este argumento, que foi apresentado pelo Pe. William Roberts, John Daly, diz isso: «Este argumento, em nossa opinião, torna absolutamente necessário que qualquer católico que considere legítimo continuar a acreditar no heliocentrismo, pelo menos em particular, após os decretos de 1616 e 1633, a sustentar que o Papa Pio IX, quando chamado a avaliar a obrigação em consciência criada pelas decisões das suas próprias Congregações Sagradas em seu nome, exagerou gravemente nelas. Isso é naturalmente difícil de acreditar.» Pelo contrário, não é difícil sustentar que o Papa Pio IX estava errado sobre este assunto ou que ele exagerou a obrigação que foi criada pela sua forma comum de aprovação de um acto de uma Congregação Romana.
Em primeiro lugar, ao expressar que a aprovação da sua forma comum deveria ter bastado para para um arcebispo resolver o assunto brevemente, Pio IX não usa de modo algum linguagem que exige que a decisão seja infalível. Pode-se interpretar que significa que a decisão simplesmente requer obediência, que, como afirmado acima, é o que os actos das Congregações Romanas devem receber, a menos que contradigam algo de maior autoridade ou um facto claro. E qual era a boa razão para rejeitar a decisão contra as obras de Guenther afinal? A decisão original deveria ter sido suficiente para todos.
Em segundo lugar, se o caso acima mostra que as decisões das Congregações Romanas aprovadas por um papa em forma comum decidem questões de fé vinculativamente de uma vez por todas, então o Papa Pio IX estava ele próprio em violação do seu próprio princípio porque ele, juntamente com seus imediatos predecessores e sucessores, permitiu que o heliocentrismo fosse ensinado bem depois de este ter sido condenado no século XVII por inúmeras Congregações Romanas. Ele estava, portanto, obviamente inconsciente ou em rejeição consciente das decisões vinculativas passadas das Congregações Romanas contra o heliocentrismo. Ora, é certamente possível que Pio IX, o papa reinante, desconhecesse os detalhes relativos ao caso de Galileu. (Isso estaria em sintonia com a nossa posição de que muitos teólogos e até alguns papas não investigaram, reconheceram e / ou avaliaram a posição dogmática da necessidade absoluta do baptismo de água que exclui baptismo de desejo). No entanto, se o Papa Pio IX e outros papas poderiam não ver ou permanecer inconscientes do significado da natureza vinculativa das decisões das Congregações Romanas no caso de Galileu, que foram aprovadas em forma comum por seus predecessores, então, é igualmente possível que, ao expressar a obediência normal necessária à decisão de uma Congregação Romana, em relação aos erros óbvios de Anton Guenther, o mesmo papa poderia ter exagerado o significado da sua aprovação em forma comum no seu comunicado ao arcebispo, ou falhado em notar que eles não são absolutamente vinculativos em todos os casos, mas apenas geralmente, quando algo de maior autoridade não está em questão.
A LINGUAGEM DO PAPA SÃO PIO X MOSTRA A DISTINÇÃO ENTRE APROVAÇÃO EM FORMA COMUM E EM FORMA ESPECÍFICA DADAS OS ACTOS DE CONGREGAÇÕES ROMANAS
A este respeito, é muito útil ver a linguagem usada pelo Papa São Pio X em seu Motu Proprio de 18 de Novembro de 1907. Na primeira parte deste extracto, vemos que o Papa Pio X está a abordar a autoridade das decisões da Pontifícia Comissão Bíblica (outra Congregação Romana) que foi aprovada por ele em forma comum. O que veremos é que Pio X, mesmo depois de intervir para enfatizar a autoridade dessas decisões aprovadas em forma comum, enfatiza repetidamente que elas exigem «obediência». Isso dá um tremendo apoio à posição que as decisões das Congregações Romanas aprovadas por um papa devem ser seguidas e que elas exigem obediência no curso normal de acção, mas não são infalíveis e, portanto, podem ser contrariadas caso contradigam algo de maior autoridade ou um facto conhecido.
Papa São Pio X, Motu Proprio, 18 de Novembro de 1907: «… certas excelentes decisões foram publicadas pela Pontifícia Comissão Bíblica, muito útil para o verdadeiro avanço dos estudos bíblicos e para direccionar o mesmo através duma norma definida. No entanto, notamos que não faltam aqueles que não receberam tais decisões com a obediência adequada, apesar de serem aprovadas pelo Pontífice.
«Portanto, vemos que deve ser declarado e ordenado como Nós agora declaramos e expressamente ordenamos, que todos estão vinculados pelo dever de obediência de consciência a submeter-se às decisões da Pontifícia Comissão Bíblica, tanto os que até agora foram publicados quanto os que serão proclamados daqui em diante, assim como aos decretos das Sagradas Congregações pertinentes à doutrina e aprovados pelo Pontífice; e que todos os que impugnam decisões como estas, por palavra ou por escrito, não podem evitar a acusação de desobediência, ou, por isso, estarem livres de pecado grave; e isso além do escândalo pelo qual eles ofendem, e outras questões para as quais eles podem ser responsáveis diante de Deus, especialmente por causa de outros pronunciamentos a respeito destes assuntos feitos de forma precipitada e errónea.» (Denz. 2113)
Podemos ver a ênfase na obediência. Pio X menciona o conceito de pecado grave para aqueles que «impugnam» tais decisões, mas menciona isso no contexto de «desobediência». Isso faz sentido: impugnar precipitadamente a decisão duma Congregação Romana seria algo muito errado, pois representa a cuidadosa decisão dos cardeais escolhidos pelo papa e que atuam com a aprovação implícita do papa. No entanto, isso não significa que se, num caso muito raro, alguma autoridade maior contrariasse tal decisão que esta não poderia ser rejeitada. Isto é corroborado pelo ponto abaixo.
Ora, repare por favor na linguagem bem diferente que o Papa São Pio X usa em referência ao Decreto do Santo Ofício intitulado Lamentabili. Esta foi a lista dos erros dos modernistas condenados pelo Santo Ofício em 3 de Julho de 1907. Este decreto do Santo Ofício é um excelente exemplo de um que foi aprovado por um papa em forma específica:
Papa São Pio X, Motu próprio, «Praestantia Scripturae», 18 de Novembro de 1907: «Além disso, com o intuito reprimir a audácia de espírito que aumenta a cada dia de muitos modernistas, que por sofismas e artifícios de todo tipo tentam destruir a força e a eficácia não só do Decreto “Lamentabili sane exitu,” que foi publicado por Ordem Nossa pela Sagrada e Universal Inquisição Romana a 3 de Julho do ano presente, mas também da nossa carta encíclica, “Pascendi Dominici gregis,” datada de 8 de Setembro deste mesmo ano pela nossa autoridade apostólica, Nós repetimos e confirmamos não só o decreto da Sagrada e Suprema Congregação, mas também aquela Nossa carta encíclica, acrescentando a pena de excomunhão contra todos os que os contradizem; e declaramos e decretamos o seguinte: se alguém, que Deus não o permita, proceder a um ponto tal de audácia de defender qualquer uma das proposições, opiniões e doutrinas refutadas em qualquer dos documentos mencionados acima, ele é ipso facto afligido pela censura imposta no capítulo Docentes da Constituição da Sé Apostólica, primeiro entre esses é a excomunhões latae sententiae…»
Vemos que Pio X reafirma e confirma especificamente o Decreto Lamentabili do Santo Ofício, ratificando-o em forma específica. Também vemos que a linguagem de Pio X sobre aqueles que contradizem o Decreto Lamentabili (que ele aprovou em forma específica) é muito mais forte do que o que a que é usada para aqueles que contradizem as decisões da Comissão Bíblica, que foram promulgadas em forma comum. Aqueles que contradizem Lamentabili, que recebeu a sua aprovação em forma específica, são excomungados. Isto dá um tremendo suporte à posição que foi discutida acima em relação à distinção de autoridade entre actos de Congregações Romanas aprovadas em forma comum e aprovadas em forma específica, e corrobora ainda mais a posição que eu enunciei acima sobre o juízo adequado dos actos de Congregações Romanas vis-à-vis Galileu, geocentrismo e heliocentrismo.
Objecção –
Syllabus dos Erros, n.º12: «Os decretos da Sé Apostólica e das Congregações Romanas impedem o livre progresso da ciência.» ― condenado pelo Papa Pio IX (Denz. 1712)
Alguns poderiam usar esta citação para argumentar que os decretos das Congregações Romanas contra o heliocentrismo e a negação do geocentrismo tinham que ser correctos; caso contrário, eles dizem que estes teriam impedido o «o livre progresso da ciência.» Eu responderia ressaltando que o erro condena aqueles que dizem que os decretos da Sé Apostólica e das Congregações Romanas impedem o livre progresso da ciência. A Sé Apostólica é a Sé ou Cátedra do Bispo de Roma. Por outras palavras, «a Sé Apostólica» refere-se a actos da Cátedra de São Pedro. Mesmo que alguns usem «a Sé Apostólica» de em sentido lato e incorrecto para descrever as Congregações Romanas, o termo descreve somente os actos da Cátedra de Pedro, como vemos nessas definições dogmáticas do Vaticano I. O Vaticano I equipara actos da «Sé Apostólica» com as declarações infalíveis da Cátedra de São Pedro:
Papa Pio IX, Concílio Vaticano I, Sessão 4, Cap. 4:«E como o sentimento de Nosso Senhor Jesus Cristo não pode ser ignorado quando Ele diz: “Tu és Pedro; e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja” [Mt. 16:18], as palavras que foram ditas são comprovadas pelos resultados reais, já que na Sé Apostólica, a religião católica sempre foi preservada e a santa doutrina celebrada.» (Denz. 1833)
Papa Pio IX, Concílio Vaticano I, Sessão 4, Cap. 4, ex cathedra: «… sabendo muito bem que a Sé de São Pedro permanece irrepreensível de qualquer erro, de acordo com a divina promessa de nosso Senhor e Salvador, feita ao chefe de Seus discípulos: «Orei por ti [Pedro], que a tua fé não falte: e tu, uma vez convertido, confirma os teus irmãos» (Lc 22, 32).» (Denz. 1833)
Assim, o n.º12 da Syllabus dos Erros não indica que os actos das Congregações Romanas são infalíveis. Isso indica que os decretos da Sé Apostólica (o papa falando desde a cátedra de Pedro) e as Congregações Romanas não poderiam ambos impedir o livre progresso da ciência.
CONTINUANDO COM O CASO DE SANTA JOANA PARA ENTENDER EM QUÊ CONSTITUI «FIDELIDADE À IGREJA»
É importante agora continuar com a análise do caso de Santa Joana d'Arc. Uma vez que Santa Joana d'Arc foi capturada pelos ingleses na França, ela foi entregue ao bispo francês, Pierre Cauchon. Ele foi ex-reitor da Universidade de Paris, considerada a principal universidade do mundo na época. Ela eventualmente foi transferida para um tribunal da Inquisição dominado por vários teólogos doutos do seu próprio país. O assunto em questão era a origem das suas vozes, e se ela se submeteria à decisão da Igreja sobre elas:
«Quando todos os argumentos quanto à responsabilidade foram ouvidos, mantém-se um facto certo: sacerdotes e advogados franceses tentaram e condenaram Joana, e todas as testemunhas contra ela eram francesas… Como era, cinco bispos, trinta e dois doutos em teologia, dezasseis bacharéis de teologia, nove doutos em direito civil e canónico, sete doutos em medicina e mais de oitenta outros sacerdotes e advogados estiveram envolvidos no seu julgamento. Todos eram franceses, exceptuando cinco. (John Beevers, St. Joan of Arc, Doubleday, 1959, pp. 138-139.)
Esta é, uma vez mais, uma poderosa ilustração da falsidade do argumento, muitas vezes pregado de cima do púlpito por adeptos de baptismo de desejo, que não se deve divergir do ensinamento de teólogos. O que é mais fascinante neste caso, no entanto, é a acusação principal apresentada contra Joana no julgamento. A acusação principal apresentada contra Joana em seu julgamento ― a acusação que a condenou que foi principalmente responsável pela sua condenação pelo tribunal como uma herege ― era que supostamente se recusara a se submeter à «decisão da Igreja». Gostaria de citar alguns parágrafos para que o leitor se familiarize com alguns dos detalhes:
John Beevers, St. Joan of Arc, pp. 138-139: «[No julgamento] Então, algo novo foi apresentado a Joana. Foi a pergunta extremamente perigosa: “Sujeitarás o que disseste e fizeste à decisão da Igreja?”
A sua resposta foi: “Tudo o que eu disse e fiz está na mão de Deus e a Ele me comprometo. Eu não diria nem faria nada contra a fé cristã, e se eu mantivesse qualquer coisa que o clero declarasse ser contra essa fé, não a sustentaria, mas a expeliria de mim.” Ora, esta não foi uma resposta satisfatória de forma alguma. O “clero” não é a Igreja, nem Joana diz quais membros do clero ela deve obedecer. Ela poderia ter em mente os eclesiásticos de Poitiers que há muito a a julgaram inocente. Foi-lhe questionado novamente se ela iria sujeitar-se à decisão da Igreja. Desta vez, ela respondeu: «Comprometo com Nosso Senhor, que me enviou, com Nossa Senhora e com todos os santos do Paraíso. Nosso Senhor e a Igreja são todos um, então, por que criais dificuldades?”
«O relatório do julgamento continua: “Foi-lhe dito que há a Igreja triunfante, onde Deus está junto com os santos e todas as almas que foram salvas; há também a Igreja militante, e essa consiste no nosso Santo Padre o Papa, o Vigário de Cristo na Terra, os prelados da Igreja, o clero e todos os bons católicos. Esta Igreja em assembleia apropriada não pode errar sob a orientação do Espírito Santo. Portanto, foi-lhe perguntado se ela sujeitar-se-ia à Igreja militante; isto é, a Igreja na Terra. Ela respondeu que ela dirigiu-se ao rei da França em nome de Deus e em nome da Santíssima Virgem e de todos os santos bem-aventurados no Paraíso e da Igreja Triunfante acima. Foi para aquela Igreja que ela apresentou todas as suas boas acções e tudo o que tinha feito ou deveria fazer. E ela não faria nada mais quanto à sua submissão à Igreja militante.»
Nós atingimos o cerne da questão desta questão polémica e muitas outras questões relevantes para os nossos dias. Em que constitui de facto «submeter-se à decisão da Igreja»? Isto reside necessariamente na submissão ao ensinamento de teólogos? Encontra-se, em todos os casos, a submissão à decisão dos tribunais eclesiásticos? Na opinião dos seus juízes eclesiásticos, Joana teria se recusado a submeter-se «à Igreja» se ela se recusasse a rejeitar as suas vozes quando o tribunal julgou que estas eram do Diabo. Mas Joana sabia que não podia denunciar as suas vozes sobrenaturais como vozes diabólicas ― vozes essas que a guiaram desde a sua juventude e foram confirmadas por resultados extraordinários que admiravam as multidões, só porque esse grupo de teólogos dizia para o fazer. Ela sabia que não fazia sentido. Ao mesmo tempo, Joana não era suficientemente instruída ― nem eram todas as distinções envolvidas sequer necessariamente claras para os doutos naquela época e para muitos hoje ― a ponto de poder indicar que, ao recusar submissão à decisão desse tribunal eclesiástico de teólogos na França, ela não estava a recusar submissão à Igreja infalível. Ela foi incapaz debater com os seus juízes teólogos quando definiram a decisão da sua corte como a «decisão da Igreja militante», e assim, honestamente, ela teve que hesitar em dar assentimento à Igreja militante. Podemos ver que, se houvessem estado lá, alguns dos defensores mais vorazes de baptismo de desejo dos nossos dias (inclusive muitos sacerdotes sedevacantistas que consideram a negação de baptismo de desejo heresia e pecado mortal) quase de certeza juntar-se-iam aos juízes na sua condenação de Santa Joana d'Arc como uma herege e entregando-a para ser queimada ― uma herege que «afastou-se do ensinamento da Igreja». Isso é porque eles possuem uma visão gravemente distorcida sobre no quê constitui fidelidade ao ensinamento da Igreja. Tudo isso demonstra, mais uma vez, que fidelidade à Igreja, fidelidade ao Magistério, fidelidade à mente da Igreja não não reside necessariamente na fidelidade ao ensinamento de teólogos ou Congregações Romanas ou decisões menores, mas, antes de tudo, em fidelidade ao verdadeiro ensinamento infalível da Igreja.
5) Em 1664-1665, o Papa Alexandre VII promulgou em sua própria autoridade um Índice proibindo todas as obras a favor do heliocentrismo e a negação do geocentrismo; foi prefaciado pela sua bula papal que declara que o Índice como parte da bula e que esta carrega a sua autoridade papal.
De todos os argumentos a favor da infalibilidade da posição geocêntrica, este seria o mais sólido porque é o único que envolve algo que emana do papa in forma specifica (em forma específica). Na minha opinião, no entanto, este argumento também não prova o ponto. Este argumento falha porque a bula do Papa Alexandre VII diz respeito à promulgação de um Índice de livros proibidos. Esta é uma medida disciplinar. Não é uma definição de um ponto de fé ou moral a ser crido pela Igreja universal (isto é, o magistério extraordinário); nem constitui um papa a afirmar que a Igreja sempre manteve este ou aquele ponto de fé, o que envolveria o Magistério ordinário e universal.
Só porque um papa usa linguagem solene para proibir a propagação de um livro, isso não prova infalivelmente que tal livro é ruim. Para ajudar a ilustrar este ponto, é útil mencionar que o Papa Clemente XIV suprimiu solenemente a ordem jesuíta numa bula papal de 1773 com a plenitude da sua autoridade papal. Clemente XIV declarou ainda que a sua constituição nunca poderia ser revogada.
Papa Clemente XIV, Dominus ac Redemptor noster, 1773: «Nós declaramos a sociedade acima mencionada dissolvida, suprimida, apagada e abolida por toda a eternidade… Declaramos que todos os seus cargos, autoridades e funções são nulos e inválidos…»
Isso prova infalivelmente que a ordem jesuíta é ruim? Não, claro que não; foi uma medida disciplinar e foi revogada posteriormente.
Mas o que dizer de facto de o Índice promulgado pela bula do Papa Alexandre VII incluir os decretos anteriores do Santo Ofício que condenavam o movimento da Terra com base em que tal noção nega a fé? Por outras palavras, esses decretos das Congregações Romanas contra o heliocentrismo, que foram abordados anteriormente, foram anexados à sua bula. Isso não demonstra que a bula do Papa Alexandre VII ensina infalivelmente o conteúdo desses decretos anteriores contra o movimento da Terra por motivos de fé? A resposta, na minha opinião, é não. Irei agora tentar sustentar essa posição. A resposta é não porque o Papa Alexandre VII deixa claro o porquê de eles estar a anexar esses decretos menores anteriores contra o movimento da Terra à sua bula disciplinar. Para fazer tal ponto, preciso agora apresentar o Pe. William Roberts. Pe. William Roberts foi o autor do The Pontifical Decrees Against the Movement of the Earth and the Ultramontane Defense of Them (London: Parker & Co, 1885).
Pe. William Roberts era um suposto padre católico que teve grandes problemas com o dogma da infalibilidade papal em por volta da altura em que este foi definido em 1870. Por outras palavras, ele era um herege. Ele também foi um defensor totalmente convencido da posição de que a Terra não é o centro do universo. Ele escreveu um livro que tratou em detalhe as decisões contra Galileu e o heliocentrismo. Ele tentou mostrar que essas decisões foram autoritariamente aprovadas pelo Pontífice Romano em capacidade infalível e, portanto, constituíram uma prova indiscutível de que a infalibilidade papal é falsa ― uma vez que, em sua opinião, a posição não geocêntrica condenada era indiscutivelmente a verdadeira posição. Ao tentar argumentar que a bula do Papa Alexandre VII (acima referida) é infalível, o que o Pe. Roberts diz abaixo é extremamente relevante. Depois de citá-lo, irei concentrar-me nalgumas palavras que o Pe. Roberts usa para resumir os pontos da bula do Papa Alexandre VII. O ponto em que me focarei é o que eu creido que refuta o argumento de que a bula do Papa Alexandre VII é infalível:
Pe. Willian Roberts, The Pontifical Decrees Against the Movement of the Earth: «No final do seu pontificado, ocorreu a Alexandre VII que era dever seu como guardião da casa de Israel, compor e colocar diante dos fiéis um novo Índice de livros proibidos que deveria ser completo até a sua época e ser mais convenientemente dispostos do que índices anteriores. Com isso, ele começou a trabalhar com um número especialmente escolhido de cardeais; e em março de 1664 emitiu da imprensa do Vaticano um livro intitulado Index Librorum prohibitorum Alexandri VII Pontificis Maximi jussu editus. Foi prefaciado por uma bula em que o papa descreve a composição do seu Índice, e fornece razões para a sua publicação. Entre outras coisas, o Pontífice diz que os livros nele anotados não serão encontrados distribuídos em três classes como estavam no índice Tridentino. Esse método de arranjo foi considerado inconveniente, e deu origem a estimativas equivocadas do carácter relativamente ruim dos livros proibidos. No entanto, é até agora retido que a classe a que cada livro pertence será encontrada citada onde o livro é nomeado, e também o decreto pelo qual o livro foi originalmente proibido, para que toda a história de cada caso possa ser conhecida.
“Para este propósito,” prossegue o Pontífice, “fizemos com que os índices Tridentino e Clementino sejam adicionados a este Índice geral, e também a todos os decretos relevantes até ao tempo presente, que foram emitidos desde o Índice de nosso antecessor Clemente, que nada lucrativo para os fiéis interessados em tais assuntos possa parecer omitido. Desde então, todas essas instruções foram realizadas de forma fiel e precisa, e um Índice geral deste tipo foi composto ― para o qual também as regras do Índice Tridentino, com as observações e instruções adicionadas ao Índice Clementino, foram prefixadas; o mesmo índice geral apresentado, composto por requerimento nosso, revisado e impresso na imprensa da nossa Câmara Apostólica, e que deve ser considerado como se estivesse inserido nestes presentes, juntamente com todos, e singular, as coisas nele contidas, nós, tendo tomado o conselho de nossos cardeais, confirmamos e aprovamos com autoridade apostólica pelo tenor desses presentes, e ordenamos a todas as pessoas em todos os lugares a prestarem a este Índice uma obediência constante e completa.”
“[Pe. Robert diz:]: Voltando a este Índice, encontramos entre os decretos que o papa adicionou ao mesmo, o seguinte: Quia ad notitiam de 1616; o monitum de 1620, declarando os princípios defendidos por Copérnico sobre a posição e os movimentos da Terra como “repugnantes às Escrituras e à sua interpretação verdadeira e católica;” o édito assinado por Belarmino que proíbe e condena o Epítimo Astronomie Copernicanae de Kepler; o édito de 10 de Agosto de 1634 proibindo e condenando o diálogo de Galileu Galilei; e sob o título “Libri,” encontramos: “Libri omnes docentes mobilitatem terrae e immobilitatem solis, em decr. 5 Martii, 0505.” Essas, portanto, foram algumas das coisas que o papa confirmou e aprovou com a autoridade apostólica pelo tenor da sua bula.»
Em primeiro lugar, observe que a bula do Papa Alexandre VII tem por objecto uma medida disciplinar: a promulgação de um novo Índice de livros proibidos. É por isso que é necessária «obediência» a esta decisão disciplinar. Este novo Índice teve vários decretos passados, como lemos acima. Ao promulgar esta medida disciplinar, o papa não declarou infalivelmente que todos devem crer nas coisas contidas nos decretos anteriores do Santo Ofício, etc., que foram anexados ao Índice. Não, como o Pe. Roberts diz, o Papa Alexandre VII anexou esses outros decretos «para que toda a história de cada caso possa ser conhecida». Ter decretos menores associados a uma medida disciplinar para que a história de cada caso possa ser conhecida é muito diferente de declarar solenemente (para ser crido pela Igreja universal) todos os pontos contidos nesses decretos anexados ao Índice. Eu acredito que isso mostra claramente que a bula do Papa Alexandre VII foi uma medida disciplinar que não promulgou infalivelmente os decretos anexados a essa medida disciplinar. Uma vez que sua bula não declarou solenemente qualquer ponto de fé, não foi um pronunciamento ex cathedra. Os papas nos anos vindouros, como o Papa Bento XIV, o Papa Pio VII, o Papa Gregório XVI, Leão XIII, Papa Bento XV, etc., obviamente concordaram com esta avaliação.
Portanto, acredito que é claro que a posição correcta sobre a questão controversa de saber se a Igreja Católica chegou a definir infalivelmente a visão geocêntrica do universo como um ensinamento vinculativo, é que não definiu.
E quanto ao ensinamento da Sagrada Escritura?
SERÁ QUE O ENSINAMENTO DA ESCRITURA REQUER QUE UMA PESSOA ACEITE A VISÃO GEOCÊNTRICA DO UNIVERSO?
Até agora, avaliei a questão de saber se alguma das acções contra Galileu ou contra o conceito do movimento da Terra constitui um ensinamento infalível da Igreja a favor da visão geocêntrica do universo. Creio eu que eu mostrei que a resposta é não. Mas a linguagem das escrituras exige que uma pessoa sustente essa visão? Por exemplo:
Salmo 103:5: «Fundaste a terra sobre as suas bases, e não vacilará pelos séculos dos séculos.»
Alguns defensores da visão geocêntrica do universo dizem que esta passagem da Escritura vincula a todos a sustentar a posição geocêntrica:
John Daly, The Theological Status of Heliocentrism: «Enquanto alguns dos outros textos que, naturalmente, supõem um sistema geocêntrico (Mateus 45:45 [sic] e Efésios 4:26, por exemplo) poderiam, de certo modo, ser entendidos como referindo-se a aparências e empregando linguagem comum sem atestar a sua precisão científica, isto claramente não se aplica ao exposto ou ao Salmo 103:5: “Fundaste a terra sobre as suas bases, e não vacilará pelos séculos dos séculos.”»
Neste contexto, as pessoas geralmente citam um versículo semelhante do Salmo 92:
Salmo 92:1: «O Senhor reina, vestiu-se de majestade, vestiu-se o Senhor de poder, cingiu-se, e firmou o universo, que não será abalado.»
Para formar uma opinião mais esclarecida sobre se esses textos provam ou não a visão geocêntrica do universo, seguem-se três passagens da Escritura que, a meu ver, ainda não foram apresentadas nesse contexto:
Provérbios 10:30: «O justo não será nunca abalado, porém os ímpios não habitarão sobre a terra.»
Salmo 14:5: «… que não empresta o seu dinheiro com usura, nem aceita dádivas contra o inocente. Quem faz estas coisas não será jamais comovido.»
Salmos 111:5-6: «Ditoso o homem que se compadece e empresta, que dispõe as suas coisas com justiça; jamais será abalado.»
Nós vemos que a declaração bíblica, «nunca será abalado», não é aplicada só à Terra, mas três vezes ao homem justo. Uma vez que obviamente não somos obrigados a sustentar que o homem justo é o centro imóvel do universo, isso pode mostrar que as palavras no livro dos Salmos não significam necessariamente que a Terra permaneça imóvel no centro do universo.
E as outras passagens da Sagrada Escritura que são frequentemente citadas a este respeito?
John Daly: «Quanto à questão factual de se a Sagrada Escritura realmente ensina inequivocamente o sistema geocêntrico, consideramos que qualquer tentativa de negar o facto é compartilhar o mesmo absurdo daqueles que conciliam o Génesis com a evolução. Em Josué 10:12-13 é relatado o milagre pelo qual, a fim prolongar o dia para os israelitas derrotarem os cinco reis que atacaram Gabaon, Deus deteve o movimento do Sol e da Lua: “E o sol e a lua pararam… parou pois o sol no meio do céu, e não se apressou a pôr-se durante quase o espaço de um dia.»
“Um milagre semelhante é relatado em 4 Reis 20:1 em que o profeta Isaias realmente fez com que o sol se movesse em sentido contrário como um sinal para Amós. É verdade que o texto refere-se apenas ao movimento retrógrado da sombra no relógio solar que, na hipótese heliocêntrica, poderia igualmente ter sido produzido por reverter o movimento diário da terra, mas esta interpretação é descartada por Isaías 38:8 que relata o mesmo evento em termos objetivos: “E o Sol retrocedeu dez graus, que tinha avançado.”»
E quanto a esses argumentos do livro de Josué e 4 Reis? Ao responder a isso, deve-se reiterar novamente que a Bíblia é a palavra infalível e inerrante de Deus. Isto é verdadeiro em todas as suas partes, em toda a sua história e em todos os assuntos que ensina. Seria herético afirmar que a Sagrada Escritura erra em sua história ou em sua descrição das coisas enquanto elas ocorriam. No entanto, como o Papa Leão XIII salienta em sua encíclica sobre a Sagrada Escritura:
Papa Leão XIII, Providentissimus Deus n.º18, 18 de Novembro de 1893: «… os santos escritores, ou, para falar com mais precisão, o Espírito Santo “o Qual falou por eles, não pretendia ensinar a esses homens essas coisas (isto é, a natureza essencial das coisas do universo visível), coisas que não são proveitosas para a salvação” [Santo Agostinho]. Por isso, eles não procuraram penetrar os segredos da natureza, mas descreveram e trataram as coisas em linguagem mais ou menos figurativa, ou em termos que eram comumente usados na época e que em muitos casos estão em uso diário hoje em dia, mesmo pelos mais eminentes homens de ciência. O discurso ordinário vem principalmente e apropriadamente dos sentidos; e, de certo modo, da mesma forma os escritores sagrados ― como o doutor angélico [Santo Tomás de Aquino] nos recorda ― “foram pelo que parecia sensivelmente” [Summa Theologica, Pt. I, q. 70, a. 1, ad. 3] ou relataram o que Deus, falando aos homens, significou, da maneira como os homens as poderiam entender e pela qual estavam acostumados.”»
Tomemos como exemplo do que o Papa Leão XIII está referir-se a seguinte passagem de Josué 18 ― o mesmo livro que figura muito proeminente no cerne da controvérsia do geocentrismo:
Josué 18:15-16- «Pelo meio-dia, a sua fronteira vai da parte de Cariatiarim para o mar, e chega até à fonte das águas de Neftoa; (em seguida) desce até àquela parte do monte, que olha para o vale dos filhos de Enom, e que está ao setentrião, na extremidade do vale dos Refains; depois desce a Geenom (isto é, ao vale de Enom) ao lado do Jebuseu, pelo meio-dia, e chega até à fonte de Rogel…»
Aqui vemos um exemplo claro do que o Papa Leão XIII está a falar. Os montes olham para as coisas? Não. A declaração da Sagrada Escritura sobre o monte é, no entanto, absolutamente verdadeira. Está a descrever o lado do monte que defronta o vale dos filhos de Enom. Isso foi significado, como diz o Papa Leão XIII, «como os homens podiam entender e estavam acostumados», neste caso, referindo-se a «àquela parte do monte, que olha para o vale», mesmo que os montes literalmente não «olhem para» coisas.
Outro exemplo seria uma frase que ocorre em todo o Antigo Testamento: Deus repetidamente promete ao Seu povo que Ele entregaria os seus inimigos «em suas mãos."
Josué 10:8 – «O Senhor disse-lhe: Não os temas, porque os entreguei em tuas mãos; nenhum deles te poderá resistir.»
A Bíblia também declara após o facto ― por outras palavras, como facto histórico ― que o Senhor entregou os cananeus e os perizeus em suas mãos:
Juízes 1:4- «E subiu Judá, e o Senhor lhe entregou na sua mão os cananeus e os perizeus; e feriram deles, em Bezeque, a dez mil homens.»
O Senhor literalmente entregou todos os dez mil «em sua mão»? Muitos deles provavelmente foram mortos pela espada e não acabaram em sua mão. Então, mesmo que alguns hoje considerem essa afirmação como imprópria de acordo com a regra literal de como as coisas são compreendidas e expressas hoje, era absolutamente correcta e historicamente precisa de acordo com a forma como as coisas eram expressas e compreendidas então; pois o Senhor entregou seus inimigos em seu poder para serem eliminados.
Além disso, o Papa Leão XIII enfatiza (ao citar São Tomás) que os santos escritores expressaram com precisão «pelo que parecia sensivelmente».
Josué 10:12-13 – “Então Josué falou ao Senhor, no dia em que o Senhor deu os amorreus nas mãos dos filhos de Israel, e disse na presença dos israelitas: Sol, detém-te em Gibeom, e tu, lua, no vale de Ajalom. E o sol se deteve, e a lua parou, até que o povo se vingou de seus inimigos. Isto não está escrito no livro de Jasher? O sol, pois, se deteve no meio do céu, e não se apressou a pôr-se, quase um dia inteiro.»
Todos os que estavam presentes neste milagre teriam visto o mesmo de acordo com as aparências externas: o sol e a lua pararam e não desceram. Mas, como o Papa Leão XIII enfatiza, ao informar com precisão esse milagre e o que ocorreu de acordo com fenómenos externos, eles não «procuraram penetrar os segredos da natureza»; isto é, os livros sagrados não procuraram nem pretendem nesta área explicar se essa aparência externa era porque o sol realmente parou ou foi criado porque foi a Terra que de facto parou. Até hoje, os astrónomos falam do nascer do sol na Filadélfia.
Assim, mesmo que a visão geocêntrica do universo não seja correcta, essas passagens da Bíblia não prejudicam de modo algum o poder, a verdade histórica ou a precisão da Sagrada Escritura em todos os aspectos do seu ensinamento; pois o que é relatado é exactamente o que foi observado de acordo com fenómenos externos (como resultado de um milagre de Deus), sem adentrar nas razões para a criação desses fenómenos externos.
Dito isto, estou aberto à possibilidade de que as passagens da Sagrada Escritura acima mencionadas ensinem a visão geocêntrica do universo. Eu simplesmente não sei qual das duas visões é a correcta. O objectivo deste artigo não é tentar demonstrar qual posição é verdadeira, mas examinar se a Igreja Católica ensinou infalivelmente a visão geocêntrica do universo ou condenou a negação dela. Eu acredito que a resposta é não.
IMPORTANTE SUMÁRIO CONCLUSIVO DOS PONTOS
A favor de o geocentrismo ser vinculativo |
Contra este ser vinculativo |
1616 – onze teólogos do Santo Ofício condenam o heliocentrismo com aprovação tácita do Papa Paulo V - São Roberto Belarmino transmitiu a sua decisão a Galileu e considerou-a vinculativa; ele considera o geocentrismo como de fide - A Congr. do Índice publicou um Decreto proibindo todas as obras a favor do heliocentrismo 1633 - O Santo Ofício considera Galileu como suspeito de heresia por favorecer o heliocentrismo; ele é obrigado a fazer uma abjuração que indica que o heliocentrismo é herético e que o geocentrismo é de fide; isto é feito com a aprovação do Papa Urbano VIII 1664-1665 – Papa Alexandre VII promulga um Índice por própria autoridade proibindo todas as obras que contradizem o geocentrismo |
1757 – Papa Bento XIV suspende os Decretos da Congregação do Índice contra as obras heliocêntricas 1822 – Com a aprovação do Papa Pio VII, o Santo Ofício decidiu que os livros sobre o movimento da Terra poderiam ser impressos em Roma 1921 – Papa Bento XV declara explicitamente que a Terra pode não ser o centro do universo em In Praeclara Summorum - Todos os papas de 1757 até 1958 pelo menos tacitamente concordam que o heliocentrismo ou uma visão não-geocêntrica do universo pode ser mantida |
Eu acredito que demonstrei que os actos contra a negação do geocentrismo não são infalíveis. Em conclusão, gostaria de enfatizar que este caso elucida sobremaneira os parâmetros da infalibilidade da Igreja. Na verdade, tem ramificações para tantas questões que seria muito difícil incluí-las todas neste artigo. Os factos sobre esta questão obliteram os argumentos populares em favor de baptismo de desejo. Além disso, esses factos têm grande significado em refutar argumentos a favor do Planeamento Familiar Natural, que Maria é Co-Redentora, que os santos não poderiam estar confusos de boa-fé sobre posições dogmáticas de verdades sem serem hereges ou cismáticos, etc. Permitai-me resumir:
► O argumento de que o baptismo de desejo deve ser verdadeiro porque Santo Afonso (doutor da Igreja) pensou que o baptismo de desejo é de fide foi totalmente refutado. São Roberto Belarmino pensou que o geocentrismo é de fide e ele foi contraditado por vários papas.
► O argumento de que negar o baptismo de desejo é contrário ao ensinamento da Igreja Católica porque o Pe. Feeney foi denunciado em uma carta de 1949 de dois membros do Santo Ofício, foi obliterado. Demonstrou-se que em 1616, onze teólogos do Santo Ofício denunciaram o heliocentrismo e, numa abjuração de 1633, compostas pelo Santo Ofício, o geocentrismo foi declarado de fide e a sua negação como herética. Ambos os actos foram contrariados por papas posteriores.
► O argumento semelhante, porém diferente, de que a necessidade absoluta do baptismo de água não poderia ter sido solenemente definido pelo papa São Leão o Grande ou pelos Concílios de Florença e Trento porque nesse caso Santo Afonso teria sido um herege, foi também refutado. Irei citar o defensor doebaptismo de desejo John Daly, que, sem querer, prova o ponto: «… se o heliocentrismo foi infalivelmente condenado pela Santa Sé, nunca houve qualquer ponto na história da Igreja no qual este fora universalmente reconhecido como tal e quase quatro séculos já se passaram, durante os quais quase nenhum católico percebeu correctamente o verdadeiro estatuto teológico do heliocentrismo.» O que ele não acrescentou é que se o heliocentrismo não foi infalivelmente condenado pela Santa Sé, então numerosos papas (por exemplo, Paulo V e Urbano VIII) e um doutor da Igreja (São Roberto Belarmino) actuaram como se tal tivesse sido e, portanto, desconheciam a verdadeira posição teológica desta questão. Se eles podem ter estado totalmente errados sobre a verdadeira posição teológica deste ponto controverso, então, certamente Santo Afonso e outros poderiam estar errados também no que respeita a posição dogmática da necessidade absoluta do baptismo de água. Assim, de qualquer forma, o nosso ponto é comprovado.
► O argumento de que baptismo de desejo ou salvação para «o ignorante invencível» não poderia ser herético porque numerosos papas (especialmente a partir do final dos anos 1800) permitiram que essas ideias fossem distribuídas e disseminadas em fontes falíveis (catecismos, manuais de teologia, etc.) sem condená-las, foi totalmente refutado. Como demonstra a tabela acima, numerosos papas desautorizaram a circulação do heliocentrismo por razões de fé e, e depois tantos quantos a permitiram. Assim, o facto de que papas como Pio IX, Leão XIII e Pio X reinaram quando heresias claras contra o dogma da salvação foram ensinadas em muitos catecismos, manuais de teologia, etc., não revela absolutamente nada.
► O argumento apresentado pelo Bispo Pivarunas da CMRI, o vigoroso defensor do controle de natalidade «natural», que Planejamento Familiar Natural ou o método do ritmo deve ser aceite porque foi ensinado em discursos do Papa Pio XII, e até mesmo por membros do Santo Ofício em resposta a consultas desde a década de 1880, foi totalmente refutado. Assim como as numerosas decisões tomadas pelos membros do Santo Ofício no caso de Galileu não resolveram esse caso e foram completamente contraditas pelo Papa Bento XV, as decisões e declarações dos membros do Santo Ofício e Pio XII sobre a PFN não foram infalíveis e contradizem a doutrina mais solene do Papa Pio XI em Casti Connubii. Além disso, a declaração de Bento XV de que a Terra pode não ser o centro do universo numa encíclica é mais formal do que os discursos em que Pio XII ensinou PFN e baptismo de desejo. No entanto, a posição enunciada pelo Papa Bento XV na sua encíclica de 1921 não foi mantida pelo Papa Paulo V e Papa Urbano VIII, que deram a sua aprovação à posição oposta.
► O argumento de que não pode ser contrário ao dogma dizer que Maria é nossa Co-Redemptrix porque o Papa Leão XIII e um ou dois outros papas a trataram por tal nome em declarações não infalíveis foi refutado. Os factos acima indicados mostram que numerosos papas consideraram que o geocentrismo era uma questão de fé estabelecida, enquanto muitos outros papas não o fizeram. Assim, a nossa posição de que não se pode chamar Nossa Senhora de «Co-Redemptrix» porque os Concílios de Trento (Denz. 984-987) e Florença (Denz. 711) declaram especificamente que somente Jesus Cristo é o nosso Redentor é perfeitamente e teologicamente sólido do ponto de vista da evidência papal e do facto de papas poderem, em suas capacidades falíveis, falhar em reconhecer isso.
Esses factos fornecem uma marcante reivindicação à abordagem dessas questões que nós enunciamos no Mosteiro da Sagrada Família. Esta abordagem adere intransigentemente às infalíveis definições da Igreja Católica e suas definições tal como «uma vez declaradas» (Vaticano I, Denz, 1800), mesmo que numerosas declarações de estimadas autoridades ou papas em capacidades falíveis as contradigam. Esta informação não só reivindica a nossa posição, mas ilustra de forma poderosa que os hereges perniciosos, como o Pe. Cekada, Bispo Dolan, Bispo Kelly, Bispo McKenna, Bispo Pivarunas, Bispo Sanborn, John Daly, John Lane, etc., que têm enganado muitas pessoas com base em sua aparência pseudo-intelectual de fidelidade à Igreja mediante argumentos de teólogos, de Santo Afonso, da condenação do Pe. Feeney, e do seu desrespeito por argumentos de definições dogmáticas, foram completamente refutados e provado errados.
Vitória, vitória, vitória mais uma vez e sempre para aqueles que aderem intransigentemente às definições dogmáticas indiscutivelmente infalíveis, e que não se deixaram intimidar por aqueles que apelam da autoridade da Igreja para a autoridade dos homens!
Papa São Leão o Grande, carta dogmática a Flaviano, Concílio de Calcedónia, 451: «Que ele ouça o que o bem-aventurado Apóstolo Pedro prega, que a santificação pelo Espírito é efectuada mediante a aspersão do sangue de Cristo (1 Pedro 1:2); e não o deixeis esquivar-se das palavras do mesmo apóstolo, sabendo que fostes resgatados da vossa vã maneira de viver recebida de vossos pais, não a preço de coisas corruptíveis, de prata ou de ouro, mas pelo precioso sangue de Cristo, o cordeiro sem defeito e sem mancha (1 Pedro 1:18). Nem deverá ele resistir o testemunho do bem-aventurado Apóstolo João: e o sangue de Jesus Cristo, seu Filho, nos purifica de todo o pecado (1 João 1:7); e outra vez, Esta é a vitória que vence o mundo, a nossa fé. Quem é que vence o mundo, senão aquele que crê que Jesus é o Filho de Deus? Este Jesus Cristo é aquele que veio pela água e pelo sangue; não com água somente, mas com água e com sangue. E o Espírito é o que dá testemunho, porque o Espírito é a verdade. Com efeito, são três os que dão testemunho: o Espírito, a água e o sangue, e estes três são uma e a mesma coisa (1 João 5:4-8). POR OUTRAS PALAVRAS, O ESPÍRITO DA SANTIFICAÇÃO E O SANGUE DA REDENÇÃO E A ÁGUA DO BAPTISMO. ESTES TRÊS SÃO UM E PERMANECEM INDIVISÍVEIS. NENHUM DELES É SEPARÁVEL DO SEU ELO COM OS OUTROS.»
Papa Paulo III, Concílio de Trento, Cân. 2 sobre o Sacramento do Baptismo, Sess. 7, 1547, ex cathedra: «Se alguém disser, que a água verdadeira, e natural não é da necessidade do Baptismo; por cuja causa converter em alguma parábola aquelas palavras de Nosso Senhor Jesus Cristo: (João 3:5) se alguém não renascer da água, e Espírito Santo, etc.: seja excomungado.» (Denz. 858)
Papa Eugénio IV, o Concílio de Florença, Exultate Deo, 22 de Novembro de 1439: “O primeiro lugar entre os sacramentos o ocupa o santo Baptismo, que é a porta da vida espiritual; por ele nos fazemos membros de Cristo e do corpo da Igreja. E havendo pelo primeiro homem entrado a morte em todos, “se não renascermos pela água e o Espírito” como diz a Verdade, “não podemos entrar no reino dos céus” [João 3:5]. A matéria deste sacramento é água verdadeira e natural.» (Denz. 696)
Papa Paulo III, Concílio de Trento, Sess. 7, Cân. 5 sobre o Sacramento do Baptismo, ex cathedra: «Se alguém disser, que o baptismo [o sacramento] é livre, e não é necessário para a salvação (João 3:5): seja excomungado.» (Denz. 861)
Correção: Muito obrigado por traduzir conteúdo dos Irmãos Dimond. 👍
Viva Cristo Rei!
Deus abençoe todos os verdadeiros Católicos. 🙏🏻